terça-feira, 11 de outubro de 2011

(1) PRONUNCIAMENTOS DA ANCED-DCI E/OU DOS SEUS CEDECA ASSOCIADOS

PRONUNCIAMENTO PÚBLICO - CEDECA-RJ
DEPOIMENTO ESPECIAL EM JUÍZO E ESCUTA PROFISSIONAL

 “Nenhum tipo de violência é justificável
e todo tipo de violência é evitável”
(ONU, Estudo Mundial sobre Violência contra Crianças)

O CENTRO DE DEFESA DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (CEDECA RIO DE JANEIRO), filiado à Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente (ANCED), Seção Brasil da Defense for Children International – DCI - vem de público manifestar sua posição institucional, a respeito da PRÁTICA CONHECIDA COMO “DEPOIMENTO SEM DANO” DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES ENVOLVIDOS EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA. E CONSEQUENTEMENTE DO RECONHECIMENTO E DA GARANTIA DOS DIREITOS SEXUAIS DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES, com as conseqüentes e imprescindíveis:

(A) RESPONSABILIZAÇÃO JURÍDICA AMPLA DO ESTADO E DOS AUTORES DE CRIMES SEXUAIS e
(B) PROTEÇÃO JURÍDICO-SOCIAL DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES em situação de violência sexual (abuso e exploração sexual).
 
A partir desse posicionamento, mais especificamente vem de público explicitar sua posição institucional sobre o processamento e o julgamento das ações penais, a partir de inquéritos policiais, com especial destaque para a produção de provas processuais reconhecidas, de maneira prevalente, pelos juízos e tribunais brasileiros, e para mais especificamente ainda nesse quadro probatório, os depoimentos com inquirição em juízo de crianças e adolescentes.

1.      Não defendemos a impunidade das pessoas que cometem a violência sexual, nem o abandono da via da responsabilização penal.  Defendemos a “responsabilização jurídica ampla dos apontados como autores presumíveis de crimes sexuais contra crianças e adolescentes, tanto a responsabilização penal, como a civil, a administrativa, a disciplinar, a canônica, conforme o caso”.

2.      E mais ainda: o CEDECA RIO DE JANEIRO em consonância com a ANCED-DCI, (reconhecida nacional e internacionalmente, formalmente como entidade defensora de direitos humanos), sempre defendeu cumulativamente a responsabilização jurídica e política do Estado brasileiro, em foros nacionais e internacionais, quando, por omissão e comissão, este não cuidar com eficiência, eficácia e efetividade dessa responsabilização individual dos violadores dos direitos sexuais de crianças e adolescentes, contribuindo para sua impunidade, para a falta de proteção jurídico-social das crianças e adolescentes nessa situação (art.87, V do Estatuto da Criança e do Adolescente) e para o não atendimento direto desse público vulnerabilizado em seus direitos, por ações, serviços e programas especiais (art. 87, I e IV – Estatuto citado) das políticas públicas, particularmente das políticas sociais (assistência social, educação e saúde) e das políticas institucionais (segurança pública, relações exteriores, direitos humanos).

3.      Partilhamos da discussão sobre as causas mais profundas do alto índice de impunidade no campo dos crimes em geral e especialmente nesse campo dos crimes sexuais, buscando, ir além das causas conjunturais, tais como os defeitos na legislação penal e processual penal e o funcionamento inadequado das agências judiciais, público-ministeriais e policiais (polícia civil e especialmente a polícia técnico-científica); enfrentando a discussão sobre razões mais estruturais, qual seja o modelo “retributivista-seletista” penal; buscando colocar a questão no marco teórico do direito penal mínimo e da criminologia crítica.

4.      Dentro dessa linha, na busca da eficiência e eficácia jurídicas das leis de responsabilização dessas pessoas, o CEDECA RIO DE JANEIRO condena todas as formas de psiquiatrização equivocada da violência sexual contra crianças e adolescentes, que resultam na classificação indiscriminada de todos os acusados como “pedófilos” (parafilia sexual, sofrimento mental, com conceito restrito no campo da saúde mental). Estranha-se que - mesmo com a tendência a essa psiquiatrização do fenômeno pelos setores mais conservadores – contraditoriamente negam muitos deles equivocadamente, o atendimento urgente de autores da violência sexual (mesmo os presumidos), por serviços e programas da política de saúde e da política de assistência social, em caráter complementar, de acordo com os paradigmas ético-políticos e os princípios jurídicos dos Direitos Humanos.

5.      Defende desse modo, o CEDECA RIO DE JANEIRO que esses apontados autores de tal ato violento devem merecer atendimento especializado no campo da Administração Pública, por quaisquer, senão todos os segmentos das políticas públicas, sem prejuízo da sua responsabilização jurídica ampla, inclusive penal, de forma a garantir-lhes as devidas condições de descolamento da categoria de sobrantes, resultado da produção social de uma sociedade conservadora e neoliberal.

6.      O CEDECA RIO DE JANEIRO, na qualidade de entidade de defesa de direitos humanos, chama a atenção para a defesa dos direitos fundamentais dos indiciados, acusados e réus em ações penais, especialmente para o respeito a sua dignidade humana inalienável e para o seu direito ao devido processo legal (artigo 5º - Constituição Federal), com a garantia do contencioso processual e da ampla defesa técnico-jurídica; evitando-se que lesões a esses valores e direitos fundamentais se transformem em causas futuras de anulação de ações penais, com prejuízo para a imagem da população sobre as ações penais e o enfrentamento de modo geral das diversas formas de abuso e exploração sexual.

7.      O CEDECA RIO DE JANEIRO tem defendido igualmente que a inquirição policial e judicial de crianças e adolescentes, em depoimentos formais (com redução a termo de declaração ou de testemunho, conforme o caso) não seja considerada obrigatória e compulsória, podendo eles declarar a sua livre escolha nesse sentido e terem sua opinião considerada, na medida da sua maturidade, como reconhece a Convenção sobre os Direitos da Criança das Nações Unidas (norma constitucional por equiparação – Emenda Constitucional 45). O ônus da prova especialmente em juízo, para processamento e possível condenação dos autores de violência sexual, não deve recair exclusivamente sobre a criança e o adolescente, podendo acarretar danos irreversíveis à sua saúde mental e a sua convivência familiar e comunitária.

8.      Urge que imediatamente se promova uma qualificação dos procedimentos apuratórios na Polícia Judiciária e no Sistema de Justiça, para se trazer aos autos elementos de provas consistentes, para além das provas testemunhais, incluindo-se as documentais, periciais e indiciárias, evitando-se a revitimização das crianças e adolescentes em situação de violência sexual, através da excessiva repetição de suas ouvidas por profissionais diversos, em várias instâncias, vitória alcançada pelo movimento de mulheres, devendo-se buscar nessa área lições a serem aprendidas. A escuta técnica e os laudos periciais precisam ser mais valorizados, pois não podem ser equivocadamente confundidos como lesionadores do direito de participação de crianças e adolescentes, na forma da Convenção citada.

9.      Para tanto, visando reduzir esses danos quando do imprescindível depoimento em juízo, o CEDECA RIO DE JANEIRO insta os envolvidos na questão, especialmente o Conselho nacional de Justiça, o Conselho nacional do Ministério Público, o Conselho nacional da Defensoria Pública, a Ordem dos advogados do Brasil, a Secretaria nacional de Direitos Humanos da Presidência da República, os conselhos reguladores de profissões (sistema CFESS, CFP, por exemplo), o Movimento Nacional de Direitos Humanos, a Associação brasileira de Magistrados, Promotores de justiça e Defensores públicos da infância e da juventude e outros órgãos públicos e entidades a aprofundarem a discussão sem direcionamentos que defendam modelos concretos existentes de “depoimentos especiais” na forma do estabelecido na normativa internacional, levando-se a uma falsa “humanização da tomada de depoimentos” pelo Sistema de Justiça.

10.  Nessa linha, o CEDECA RIO DE JANEIRO defende que - quando imprescindível necessidade de inquirição de crianças e adolescentes em depoimentos formais - sejam eles assistidos imprescindivelmente nas audiências por advogado e/ou defensor público, inclusive como curador especial na forma da legislação processual vigente; não suprindo o membro do Ministério Público, com sua intervenção, essa assistência, já que autor da ação penal, vez que o superior interesse da criança/adolescente deve sobrepor-se ao desejo de perigosa celeridade no processo, com prejuízo possível para esse interesse superior e prevalente.

11.  Defende mais o CEDECA RIO DE JANEIRO, que equipes multiprofissionais obrigatoriamente previstas pelo Estatuto e recomendadas pelo Conselho Nacional de Justiça (com baixo cumprimento pelos Tribunais de Justiça dos Estados) sejam urgentemente criadas, nos quadros do pessoal permanente do Poder Judiciário, para que não fiquem sem o reconhecimento e garantia de seus direitos e sujeitados ao arbítrio dos magistrados aos quais servem nas áreas socio-jurídica, psico-jurídica, antropológico-jurídica etc. A existência de pessoal técnico-científico nesse caso dos depoimentos especiais é bem mais importante que a preocupação patrimonialista de montagem de ambientes de alta tecnologia, de difícil instalação e manutenção em todos os rincões brasileiros, onde a realidade mostra a existência de comarcas sem equipamentos, os mais simples e imprescindíveis, como instalações próprias, arquivos e aparelhos telefônicos, por exemplo, especialmente no Norte e Nordeste do país.

12.   O CEDECA RIO DE JANEIRO defende também que os técnicos que atuarem nas equipes multiprofissionais, junto a juízos da infância e juventude, criminais, de família etc., cinjam-se a suas normas deontológicas contidas em leis federais e nos princípios éticos e jurídicos dos direitos humanos; procurando apoiar, fortalecer e empoderar crianças e adolescentes levadas a juízo para inquirição em depoimentos, através dos procedimentos técnicos das escutas profissionais e do atendimento profissional especializado interno (sem prejuízo do atendimento externo pelas políticas públicas complementarmente), não devendo essa escuta ser confundida com o depoimento judicial. A intervenção do técnico não pode ser uma intervenção dúbia e pouco ética, servindo como “intérprete” para o juiz, na busca da verdade real, papel que não lhe cabe.

13.  Nesse ponto, o CEDECA RIO DE JANEIRO se coloca francamente em favor do aprofundamento e da efetividade das medidas de proteção jurídico-social (defesa de direitos) de crianças e adolescentes que sofrem abusos e explorações sexuais, particularmente quando consideradas “vítimas” em juízo de crimes sexuais, reconhecendo que tais medidas ainda são muito pouco efetivas, eficazes e eficientes no Brasil; defendendo que essas ações mereçam um papel destacado como programa na esfera da Política Nacional de Direitos Humanos, sem prejuízo do formulado, operacionalizado e controlado pelas demais políticas de Estado, inclusive a política judicial (CNJ).

14.  O CEDECA RIO DE JANEIRO – no exercício de suas funções estratégicas como defensora de direitos humanos, em consonância com princípios, diretrizes e teses aprovadas pela ANCED/DCI – propõe-se a privilegiar suas estratégias em prol do reconhecimento e garantia dos direitos sexuais de crianças e adolescentes (como direitos humanos), em torno do eixo central da proteção jurídico-social, com ações de monitoramento/avaliação, de mobilização social, de incidência/advocacy, de produção e disseminação de conhecimentos científicos e populares, de judicialização estratégica de demandas/questões e parcerizações; tendo como marcos normativos a Constituição Federal, a Convenção sobre os Direitos da Criança (e seu Protocolo específico), o Estatuto da Criança e do Adolescente e outras normas nacionais e internacionais sobre a matéria.

Para aderir ao presente Pronunciamento, envie uma mensagem para cedecarj@cedecarj.org.br indicando nome completo, documento de identidade, instituição/organização e cidade.

Rio de Janeiro, outubro, 2011.
Aprovada por unanimidade pela Presidência, Equipe & Associados do CEDECA-RJ

CEDECA - RIO DE JANEIRO (Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente)
Avenida General Justo, 275 Sala 317-A, Bloco B – Castelo - 20.021-130 - Rio de Janeiro – RJ – Brasil / website: www.cedecarj.org.br / e-mail: cedecarj@cedecarj.org.br / skype: cedeca.rj    Telefone: (55 21) 3091-4666 . Entidade de defesa de direitos filiada à ANCED - Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente (Seção Brasil DCI – Defense for Children International / Genebra) - APOIO: VIC - Vlaams Internationaal Centrum e
Stichting Sint Martinus – Neederland - UE


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