quarta-feira, 2 de novembro de 2011

(2) CONTROLE - Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente

CONSELHOS DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

Por Wanderlino Nogueira Neto

Capítulo do livro do Autor, “Direitos Humanos Geracionais – Manual para Formação no SIPIA-CEARÁ”.  2003. Fortaleza. Ed. CEDCA-CE / SDH-PR



Generalidades - A maior parte da confusão que cerca a estruturação, organização e funcionamento dos conselhos dos direitos da criança e do adolescente, no Brasil, nasce de deformações no entendimento de sua natureza jurídica e político-institucional – de sua essência. Mais das vezes há uma frustração infundada e injusta de relação a esses colegiados. É que se pretende deles coisa diversa do que eles deveriam ser e fazer; se levarmos em consideração a vigente normativa legal que os institui e a decorrente missão político-institucional que devem cumprir. Alguns esperam que eles sejam  instâncias da sociedade civil, absolutamente autônomos, sem nenhuma vinculação com o Estado. Outros, em oposição, os vêem meramente como órgãos administrativos do governo. De um lado, uns o entendem, como "tudo". De outro lado, como "nada". E no meio... a grande planície pasmacenta dos que nem os conhecem.

Natureza jurídica - Juridicamente, nos termos da lei federal 6.089/90 - Estatuto da Criança e do Adolescente, a aparente confusão se encontra resolvida (pelo menos em termos da dogmática jurídica[1]), a depender muito pouco de maiores exercícios de interpretações do texto legal que os institui  (artigo 88, II – Lei federal 8.069 de 13 de julho de 1990). Leis federais, estaduais e municipais deveriam criar formalmente esses conselhos e dessa criação dependerá sua estruturação, organização e funcionamento.

Natureza das leis de criação dos conselhos dos direitos - Todavia, importante se faz, que - de logo - se tenha como bastante claro o seguinte: o Estatuto não esgota toda a possibilidade de regulação legal da estruturação, organização e funcionamento dos conselhos dos direitos da criança e do adolescente[2]. Ele dispõe sobre a chamada "proteção integral de crianças e adolescentes" (artigo 1º - Estatuto cit.), isto é, estabelece "normas gerais de proteção da criança e do adolescente (artigo 23 – Constituição federal) – isto é, normas gerais nacionais. Mas, em seu bojo encontramos substantivamente  também normas gerais  penais e  processuais procedimentais, de organização administrativa, de organização judiciária e de organização público-ministerial – tanto como normas gerais nacionais, quanto como normas especiais federais.[3] 

Segundo a Constituição federal a competência para legislar sobre esses campos enumerados é

ü    concorrente da união e dos estados e do distrito federal no tocante à legislação de proteção da criança/adolescente e juventude,

ü    concorrente e/ou conjunta da união, estados e municípios no tocante aos demais campos de organização[4] e

ü    privativa da união no campo penal e processual.

Na falta de norma especial local (quando se trata de legislação concorrente) as normas da união poderiam ir além da sua abrangência genérica, estabelecendo essas normas específicas, que prevalecerão em cada estado ou município, até que esses entes públicos editem suas normas específicas, quando então aquelas determinadas normas federais – "permissivamente invasoras"  -  teriam sua vigência suspensa, na forma da Constituição federal.

Talvez, o grande mal na luta pela efetividade político-institucional e eficácia jurídica do Estatuto da Criança e do Adolescente  tem sido, nesses últimos 10 anos, esse imobilismo do poder legisferante estadual e municipal, complementando o Estatuto, tanto de relação a seus dispositivos - formal e substancialmente - de proteção da infância, quanto de relação a seus dispositivos, formalmente, de proteção, mas, substancialmente, de organização administrativa, judiciária e público-ministerial.

Mais das vezes, a insatisfação que surge, pressionando no sentido da reforma do Estatuto, decorra disso: em lugar de reformá-lo, "corrigi-lo", dever-se-ia regulamentá-lo - via legislativa ou administrativa [5].

Nota-se uma incipiente tentativa nesse sentido, quando da elaboração das leis municipais e estaduais de criação de conselhos, que diziam dispor também sobre a "política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente", naquele estado ou município. Lamentavelmente, elas ficaram presas a um modelo, divulgado, com a melhor das intenções, por Escritórios locais da extinta Fundação Centro Brasileiro para a Infância e Adolescência - CBIA, mas que o legislador local  não ousou ampliar e adaptar à sua realidade local, indicando diretrizes para a formulação administrativa posterior dessa política.

Lamentavelmente, vozes as mais respeitáveis, aqui e ali, se levantam, defendendo a impossibilidade de se dispor em caráter complementar sobre determinados pontos estabelecidos no Estatuto, dificultando que se melhor regule o chamado "sistema de garantia de direitos".

Mas, na verdade, data venia, uma lei federal como o Estatuto citado não poderia – sob pena de inconstitucionalidade – detalhar, por exemplo, o organização/funcionamento da justiça da infância e da juventude, das suas equipes multiprofissionais (artigos 149 e 150 do Estatuto cit.) e dos seus agentes de execução[6], dos conselhos de direitos, dos conselhos tutelares, dos serviços e programas  administrativo em regime protetivo ou socio-educativo (artigo 90 – Estatuto cit.).

Todavia, muitas vezes constata-se o contrário: ameaça-se ferretear como inconstitucionais as normas estaduais e municipais (as últimas, principalmente) que ousam complementar legitima e legalmente o Estatuto. Com isso não se quer dizer que não há normas municipais e estaduais, nesse campo, inconstitucionais. Existem! e pululam pelo país... contendo absurdos e heresias, a merecerem repúdio.

Mas isso se corrige com a produção cada vez maior de boa doutrina e a construção de uma jurisprudência comprometida com os princípios e diretrizes da doutrina da proteção integral, acolhidos pela Convenção sobre os Direitos da Criança.

Por que não se reconhecer que o Estatuto estabelece apenas normas gerais sobre criação, estruturação, organização e funcionamento dos conselhos dos direitos da criança e do adolescente; competindo às unidades federadas e aos municípios disporem, de maneira complementar, sobre essa matéria.?

Na verdade,  compete:

ü    à União estabelecer normas gerais de proteção da infância e da adolescência, de organização judiciária e público-ministerial e de organização administrativa

ü    aos estados e ao Distrito Federal estabelecerem normas especiais de proteção da infância e da adolescência 

ü    aos estados e ao Distrito federal estabelecerem normas especiais de organização judiciária e público-ministerial, inclusive também para possibilitar a operacionalização dessa proteção ("sistema de garantia de direitos") e

ü    aos estados e municípios[7], essas normas especiais de organização administrativa, na mesma hipótese (idem).

Essa regra deveria se aplicar à criação de conselhos dos direitos da criança e do adolescente e à regulação da sua organização e funcionamento

Os Conselhos enquanto órgãos públicos estatais - Ora, entendendo-se que leis federais, estaduais e municipais podem criar e organizar conselhos tais, é de se recordar que a lei só poderá instituir instâncias estatais, isto é, organizações estatais. Ou mais amplamente,  "espaços públicos institucionais".[8]

Não poderia assim fazê-lo de relação a instâncias sociais: fóruns de articulação não institucionais (Fórum DCA, Comitê de Enfrentamento da Violência Sexual, Fórum de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil), ong.s, associações, movimentos sociais, movimentos reinvidicatórios, pastorais e ministérios eclesiais etc. - isto é, organizações da sociedade. Não poderia criar espaços públicos não institucionais, já que isso feriria o princípio constitucional da livre associação e organização da sociedade. A lei (e portanto o Estado) não pode criar entes privados, organizações sociais. No máximo,  poderá regular o funcionamento delas, nas suas relações com o poder público governamental:  registros públicos, convênios etc. .

Tanto assim é que se tem por inconteste hoje não poder a lei instituidora desses conselhos – sob pena de inconstitucionalidade – estabelecer taxativamente em seus dispositivos previamente quais as entidades sociais que os integrarão, invadindo o papel da vida societária, usurpando a legítima representatividade da organização social.

Donde se deduz que os conselhos dos direitos da criança e do adolescente são órgãos estatais, isto é, instâncias públicas. E não, instâncias da sociedade civil.

Enquanto órgãos administrativos, integrantes do Poder Executivo - Mas, em se tratando de órgão publico estatal, qualquer deles há que se enquadrar em um dos três Poderes - segundo o princípio constitucional da separação e soberania dos Poderes  constitucionais.

Salvo a exceção constitucional explícita referente ao ministério público, ao qual a Constituição federal (artigos 157 a 159 – CF) reconhece  status equiparado ao de Poder, como "instituição autônoma" e "função essencial à Justiça", mas sem subordinação ou vinculação ao poder judiciário - fora do capítulo próprio desse Poder. Por exemplo, a Constituição federal considera crime de responsabilidade do presidente da República atentar contra a autonomia do poder judiciário, do poder legislativo e do ministério público. Ao chefe do ministério público se assegura a competência para a iniciativa de leis e para nomear e exonerar seus membros e servidores

Exatamente por se tratarem de órgãos públicos, integrantes da estrutura do poder executivo  e com atribuições para praticar atos de gestão pública -  tais conselhos só podem ser criados através de leis cuja iniciativa do processo legislativo seja da exclusiva competência do chefe do poder executivo[9]. Isso valendo para qualquer lei posterior, modificativa da sua estruturação organizacional ou do seu funcionamento.

Em face disso, é de se reconhecer que tais colegiados - como órgãos públicos estatais que são -  exercem funções administrativas que os fazem incluídos na esfera do poder executivo:  atribuições típicas de desenvolvimento de políticas públicas. E não as funções judicantes e legisferantes, próprias e peculiares dos poderes legislativo e judiciário. Esses, quando praticam atos administrativos, o fazem na gestão dos negócios internos da esfera de cada Poder, respectivamente, em face do princípio da sua autonomia administrativo-financeira. Isto é, os conselhos dos direitos praticam atos administrativos de execução das leis emanadas do poder legislativo -  regulamentando-as, deliberando sobre a formulação de políticas públicas, controlando as ações públicas governamentais e não governamentais, potencializando estrategicamente as políticas públicas (mobilização social etc. etc.)[10].

Não há, todavia, previsão e permissão legal no Estatuto e na lei federal de criação do CONANDA (e  não deveria haver nas leis estaduais e municipais correspondentes) para a prática de atos de coordenação e execução de políticas públicas, da responsabilidade dos órgãos próprios, governamentais e não governamentais. A coordenação de políticas públicas é típica de órgãos públicos governamentais. A execução pode ser concorrente. Em que pese se encontrar em todo país, inúmeros casos de conselhos dos direitos da criança e do adolescente que coordenam e/ou executam diretamente ações públicas, de maneira equivocada, salvo melhor juízo.

Em resumo: tais conselhos participam de determinada parte do processo de desenvolvimento das políticas de estado[11], o que implica em:

ü  normatização/formulação dessas políticas;

ü  controle das ações públicas governamentais e não governamentais;

ü  potencialização estratégica dessas políticas (mobilização, p.ex.).

Órgãos especiais, funcionalmente autônomos e administrativamente vinculados  -  O mesmo registrado atrás, a respeito dos conselhos tutelares, aplica-se aqui aos conselhos dos direitos da criança e do adolescente: autonomia funcional e não administrativo-financeira.

Órgãos colegiados - Outra peculiaridade que integra sua natureza jurídica faz do conselho dos direitos da criança e do adolescente (como obviamente diz o nome) essencialmente um colegiado. Isto é, um órgão integrado por vários agentes públicos, o que faz com que seus atos administrativos sejam atos jurídicos complexos formais, emanados de uma decisão colegiada e não de um agente singular. Em situações especiais (situações emergenciais e urgentes ou atos protocolares de representação), sempre previstas na própria lei e no seu regimento ou decorrentes de delegação expressa do plenário colegial, esses atos podem ser praticados pela sua direção ou por qualquer dos seus membros isoladamente (presidente, vice-presidente ou conselheiro-relator) e referendados posteriormente pelo colegiado ou não, a depender da definição jurídica ou da delegação.



Órgãos colegiados paritários - Determina mais o Estatuto que tais conselhos tenham composição paritária (art.88, II). E tal é repetido pelas leis estaduais e municipais correspondentes.

Em primeiro lugar, isso significa paridade quantitativa entre representantes do governo e das organizações sociais: meio a meio. Já no tocante à chamada paridade qualitativa, a matéria é mais complexa e controversa. Algumas questões, em todo o país, têm surgido a provocar polêmicas e mesmo ações judiciais.

Questões polêmicas na composição da parcela governamental - A primeira delas diz respeito à participação de representação dos outros Poderes (judiciário e legislativo) e do ministério público, integrando a parcela dita "governamental". Como o próprio nome diz e entendendo-se que se trata de um "órgão deliberativo do poder executivo", a participação dos demais Poderes e do ministério público configura uma clara invasão de um Poder sobre outro.

No caso, teríamos parlamentares e magistrados[12] praticando verdadeiros atos administrativos, atos de gestão pública, como se viu acima: normatizando/ regulamentando, deliberando sobre a formulação de políticas públicas controlando as ações públicas governamentais e não governamentais, articulando e integrando essas ações, mobilizando a sociedade etc. etc.  Os juizes e representantes do ministério público não têm, por força da sua missão institucional, essa atribuição controladora, nessa linha administrativa, gestionária. Os parlamentares a têm, mas a serem exercidas no espaço do seu colegiado  próprio (parlamento) e na forma definida pela Constituição.

O Estatuto citado reconhece o impedimento dos conselheiros tutelares (mutatis mutandi, analogamente, dos conselheiros de direitos), de relação à autoridade judiciária e ao representante do ministério público (parágrafo único do artigo 140).

Esse óbice à participação nos conselhos dos direitos não existiria se tal integração dos Poderes citados, nesses colegiados especificamente, ocorresse com previsão expressa na Carta Magna: ou com atribuições meramente consultivas   (conselhos penitenciários, onde há participação do ministério público – por exemplo) ou para a prática dos chamados "atos de império" (por exemplo, o Conselho de Segurança Nacional e o Conselho da República) e não aqueles de "governo" ou gestão.

Tratando dessa matéria, em 1993, o CONANDA editou resolução nesse sentido, solicitando mais à Procuradoria Geral da República que ajuizasse ações diretas de inconstitucionalidade, em litisconsórcio ativo com o ministério público estadual,  contra as leis estaduais e municipais que previssem tais participações – indicação com êxito em uns lugares e nenhuma providência em outros.

De qualquer maneira, a questão se encontra ainda em aberto, para discussão e produção de doutrina[13], enquanto não se firma uma tendência jurisprudencial clara, com decisões dos tribunais superiores, principalmente.

Tais razões podem ser invocadas igualmente para justificar a não inclusão, na parcela governamental dos conselhos dos direitos citados, de representantes de órgãos mesmo do poder executivo, mas de outras esferas: isto é, órgãos estaduais e municipais no CONANDA, órgãos federais e municipais nos conselhos estaduais e órgãos federais e estaduais nos conselhos municipais. Aqui, seria a invasão de uma esfera da federação em outra, integrando órgãos administrativos com poder deliberativo vinculante, participando da gestão pública de outra esfera. Igualmente,  essa questão se encontra em aberto.

Questões polêmicas na composição da parcela não governamental - Outras questões dizem respeito à "participação direta da população através suas organizações representativas"[14], nesses colegiados. Ou "participação da comunidade", na linguagem utilizada pela Constituição federal e pela legislação federal, na instituição e regulação do sistema único de saúde e do respectivo Conselho Nacional de Saúde.

A lei de criação do CONANDA e a maior parte das leis estaduais e municipais exigem que sejam entidades sociais (ou organizações sociais) de "atendimento dos direitos de crianças e adolescentes"[15] ou de "atendimento direto e defesa de direitos".

Duas questões, neste ponto, precisam ser aprofundadas e aclaradas:

ü    que se deve entender por "entidades sociais", "organizações da sociedade", "a população por suas organizações representativas", "comunidades" ?

ü    que se deve entender por "entidade de atendimento de crianças e adolescentes" e expressões assemelhadas ?

Essa discussão não encontra solução no campo específico da composição possível dos conselhos deliberativos e paritários. Seu locus  é mais amplo: a discussão sobre as categorias "sociedade", "sociedade civil organizada" e o chamado "terceiro setor", nas suas relações com as de "estado" e   "mercado".

Na verdade, essa é uma discussão mais política que jurídica: a dimensão jurídica que se dará a essas categorias, depende do seu conteúdo socio-político delas[16]. Uma discussão que nos leva ao terreno escorregadio e ainda pleno de discussões a respeito dos conceitos de "público" e "privado".

Quando a Constituição federal fala em participação direta da sociedade na democracia brasileira, pressupõe-se que admite uma esfera do público que não se confunde com a meramente "governamental": admite um "público não governamental". E isso mais se reforça com o disposto no Estatuto da Criança e do Adolescente,  que prevê política de estado através de "ações governamentais e não governamentais" (art.86).

É óbvio que tais leis não poderiam, nesse ponto, fechar mais do que fecha o Estatuto em seus dispositivos próprios: além de se tratar de norma especial federal,  estruturadora de órgão público da União, o Estatuto igualmente é norma geral nacional, reguladora de um sistema nacional de proteção dos direitos humanos da criança e do adolescente[17]. Por exemplo, a exigência de que só "entidade de atendimento direto" - como creches, abrigos, entidades  de promoção de direitos etc. - poderiam integrar os conselhos não encontra respaldo no Estatuto.

Equivocado seria também o entendimento de que não poderiam integrar esses colegiados, as entidades sociais das categorias profissionais  (sindicatos e associações de classe) e do meio empresarial, que atendem direitos de crianças e adolescentes.

Posteriormente, a Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS torna isso mais claro quando trata da composição do Conselho Nacional de Assistência Social - CNAS, definindo mais claramente os tipos de entidades sociais que garantiriam essa participação direta da sociedade no colegiado em tela, não deixando margem de dúvidas quanto a essas questões.

"O uso mistificado de 'população', 'comunidade', 'grupos sociais', é utilizado como forma de negar a existência de classes, de interesses conflitivos, buscando despolitizar as diferenças observadas nos grupos e tentando apresentar os mesmos como uma coleção neutra, passiva"[18] – isso parece bem claro quando se discute essa legitimidade e legalidade da inclusão ou não de determinadas expressões do movimento social.

Emblematicamente, quando da inicial composição do CONANDA, esta matéria foi discutida na primeira assembléia geral para escolha dos representantes das organizações sociais: discutia-se o enquadramento de determinadas entidades nos critérios legais (centrais trabalhistas, entidades de proteção jurídico-social, núcleos de estudos e pesquisas, pastorais e ministérios eclesiais etc.). Desde aquele momento - com parecer favorável da Procuradoria Geral da República que fiscalizava, então, o processo de escolha -  a assembléia geral decidiu pela ampliação do conceito de "sociedade civil organizada", especialmente para admitir a participação de representações das classes trabalhadoras[19].

Natureza político-institucional - A experiência dos conselhos dos direitos da criança e do adolescente, no Brasil, se justifica -  politicamente - como forma de se garantir a participação popular na gestão do poder, no desenvolvimento dos negócios públicos pelo estado[20]. Assim, as confusões maiores sobre a real missão político-institucional dos conselhos dos direitos da criança e do adolescente nascem de um entendimento também equivocado a respeito da democracia e do estado.

Esse papel político dos conselhos dos direitos da criança e do adolescente (como de todos os conselhos deliberativos) depende muito da concepção de democracia e de estado que se acolhe e que se pretende operacionalizar.

Visões da democracia e do estado. Conselhos deliberativos: um neo- corporativismo?  - A compreensão da democracia precisa superar dialeticamente  (sem propriamente negar...)  a tradicional concepção liberalista, enquanto "método de governar"[21], para uma concepção mais atual e radical, enquanto "forma e conteúdo de existência social"[22]. Uma utopia verossímil e viável, por se fazer, para realização paulatina e irreversível de seus princípios: liberdade, igualdade, pluralidade e participação. Especialmente – a centralidade na pluralidade. Democracia é respeito e tolerância pela diversidade.

A pluralidade é tanto de conteúdo (diversos interesses), quanto de sujeitos políticos (movimentos sociais, igrejas, partidos, sindicatos, ong etc.).  Mas, esse respeito á "diversidade de valores" possui, como limites seus, certos paradigmas éticos voltados para a convivência humana pacífica"[23]: assim, a liberdade e a igualdade são paradigmas limitativos pois para a pluralidade.

Enquanto isso, a participação ressurge como paradigma operativo para os outros três. Ela é caminho privilegiado para se construir relações libertárias, igualitárias e pluralistas.

Um outro aspecto a ser enfrentado nessa discussão sobre uma concepção mais real de democracia e de suas possibilidades de realização histórica, diz respeito aos aspectos de organização político-institucional dela, principalmente no que diz respeito ao estado. Diz respeito  à visão que se tenha do estado – decorrente daquela que se tem de democracia.

Para tanto, há que se abandonar as visões clássicas, tanto a liberal do Estado do Bem Estar Social, quanto a marxista ortodoxa da “ditadura do proletariado”, em favor de uma "visão ampliada do estado"[24], adotada inclusive no modelo político-constitucional brasileiro (Constituição federal – parágrafo único do artigo 1º) onde "sociedade política" (governo) e "sociedade civil organizada" se articulam e se integram, no espaço jurídico-político do estado. O campo estatal amplo que se erige ao lado do campo do mercado: o público em face do eminentemente privado.

O Brasil, dogmático-constitucionalmente, ficou sendo uma democracia mista - direta e indireta. Uma democracia tanto representativa, quanto participativa. E isso foi uma conquista dos movimentos populares, na época do funcionamento do Congresso Nacional como Constituinte[25]: teve-se um processo de luta social, marcado pela pluralidade, com construção de hegemonia no interior do campo democrático-popular – como reconhece SOUZA FILHO[26]. Assim, preciso é que se aperfeiçoem hoje os espaços/mecanismos de representação (sistema eleitoral, partidos políticos, funcionamento dos parlamentos, p.ex.) e os espaços/mecanismos de participação (conselhos paritários deliberativos, plebiscito, referendo, iniciativa popular do processo legislativo p.ex.).

As instituições tradicionais da democracia representativa (parlamento, processo eleitoral, governantes eleitos, justiça, segurança etc.) continuam com papel fundamental a desenvolver.

Porém é de reconhecer hoje que elas se mostraram limitadas para promover uma real democratização da sociedade e, por conseguinte, uma maior ampliação daqueles seus princípios citados: liberdade, igualdade, pluralidade e participação.

Atualmente estão nítidas as limitações existentes no sistema de representação democrática. Autores dos mais diversos matizes ideológicos corroboram esta mesma visão (BOBBIO, 1986; COUTINHO, 1992, DAHL, 1991; POULANTZAS, 1985; RIBEIRO FILHO, 1999 etc.).

Importante pois, que se promova à transformação do estado e a radicalização da democracia, através do desenvolvimento aperfeiçoado da democracia representativa e de novas formas de democracia participativa de base. E, simultaneamente, através do "estímulo de redes e focos autogestores"[27]

Interessa aqui a esta análise, em especial, a questão da democracia participativa e dos espaços e mecanismos públicos de participação: isso porque os conselhos dos direitos da criança e do adolescente (e todos os conselhos estatais deliberativos) são reconhecidos e legítimos espaços públicos de participação[28].

"A legitimidade dos conselhos sustenta-se na legitimidade da democracia participativa como arranjo institucional que amplia a democracia política Por sua vez a legitimidade da democracia participativa fundamenta-se no reconhecimento de que o arranjo neo-corporativo possibilita a construção de espaço público de conflito/negociação, baseado em ações estratégicas e discursivas complementares à ação parlamentar representativa partidária" [29].

Isso implica em se reconhecer que, numa sociedade complexa como as dos tempos atuais, as "organizações sociais participantes do mercado" (sindicatos, centrais sindicais, associações profissionais, associações empresariais, instituições filantrópicas organizadas e mantidas por empresas etc.) e as "organizações sociais produtoras/receptoras de políticas públicas" (movimentos de defesa dos direitos de negros, mulheres, crianças, homossexuais, sem-terra, associações de bairros,  de usuários da saúde, por exemplo) configuram-se ambas como "organizações corporativas sociais"[30] -  base para o funcionamento dos espaços e mecanismos públicos de participação democrática.

Essa idéia de participação da sociedade na formulação/controle das políticas de estado, através das organizações corporativas sociais, estruturou-se com base em algumas "teses" construídas principalmente pelo movimento social:

q    institucionalização de um espaço público, com representação do estado-governo e participação direta do estado-sociedade[31] (os conselhos paritários deliberativos);

q    reconhecimento, nesses espaços, da autonomia da sociedade civil em indicar  ampla e conjunturalmente determinadas "organizações corporativas sociais", como suas expressões e seus instrumentos de participação direta;

q    obediência a critérios que garantissem a participação direta -  efetiva e preponderante - nesses espaços, mais particularmente dos atores sociais estatais não governamentais, que se expressam como "organizações corporativas sociais produtoras/receptoras de políticas públicas";

q    indicação de orientação nacional, sem prejuízo das especificidades locais, para o conjunto das políticas públicas, através da distribuição de atribuições entre esses espaços.

Segundo SOUZA FILHO, "forjou-se um arranjo corporativo setorial (pois, próprio para cada área – saúde, assistência, criança) para negociar e construir hegemonia na esfera das políticas públicas sociais, através de sistema formal, articulado nacionalmente". Vê, o mesmo autor, nessa construção do que ele chama de "engenharia institucional, uma base "neo-corporativa", isto é, "corporativo-societal"[32], fruto de luta dos setores mais progressistas da sociedade e que se configura como estratégia concreta e legítima de luta social.

Através dessas "organizações corporativas sociais" e desses conselhos deliberativos  se torna possível a estruturação de uma ordem social alternativa ao "corporativismo-estatal" e ao "liberal-corporativismo". O primeiro tem um escopo nitidamente autoritário, onde as organizações são meros factóides, extensões do poder estatal[33]. O segundo pretende promover a defesa de interesses puramente privatistas, os quais seriam regulados pela lógica do "mercado político", através da implementação de lobbies junto aos poderes representativos tradicionais.

O corporativismo-social baseia-se numa "organização societal orgânica, que busca combinar hegemonia com pluralidade" (...) "onde os institutos políticos  com base neo-corporativa  facilitam a organização e expressão dos diversos interesses em pauta"[34]

Em conclusão: a definição de atores sociais no processo de participação direta na gestão pública, principalmente na escolha dos que integrarão os conselhos deliberativos (no caso, especialmente os conselhos dos direitos da criança e do adolescente e os conselhos tutelares) nada tem com os processos que legitimam a democracia representativa (processo eleitoral). Estes atores sociais, no viés da democracia participativa, são legitimados, através seus processos de escolha próprios, garantindo a participação direta das organizações corporativas sociais.[35]

Decorrentes papéis político-institucionais desses espaços públicos participativos - A partir dessa visão ampliada do “estado democrático de direito”, esses espaços públicos da linha participativa, os conselhos paritários deliberativos (e entre eles, em especial, os conselhos dos direitos da criança e do adolescente) devem ser considerado, ao mesmo tempo:

q    organizações burocráticas; e

q    espaços políticos de poder.

E como espaços políticos de poder, esses Conselhos devem se tornar, conseqüentemente:

q    aparelhos coercitivos e de integração;

q    instâncias de mediação para a práxis social; e

q    potencializadores estratégicos das políticas de estado;

Nessa ótica, os conselhos dos direitos da criança e do adolescente devem construir um papel político-institucional para si[36], que os façam espaços/instrumentos do poder estatal e possibilitem a participação direta da população no exercício desse poder, de maneira operativa e efetiva.

Não são eles espaços únicos e exclusivos, para assegurar a participação popular. Porém, importantes e estratégicos para a transformação do perfil estatal brasileiro. A estrutura organizativa e a prática de funcionamento desses conselhos podem fortalecer o estabelecimento da cultura democrática, que os ajudou a criar.

Deles são e serão inimigos ferrenhos, obviamente, todos aqueles que se opõem ao estabelecimento dessa cultura democrática: conselhos dessa natureza não combinam com corruptos e autoritários.

Organizações burocráticas - Os conselhos dos direitos da criança e do adolescente precisam se fortalecer, preliminarmente, como "organizações burocráticas".

A idéia de "equipamento burocrático estatal" não pode realmente esgotar toda a potencialidade e a riqueza do papel político-institucional de um conselho dessa natureza. Mas, não se a pode desprezar como sem importância nesse trabalho de construção geral desse papel, a fazê-los instrumentos efetivos do poder estatal.

O asseguramento de condições mínimas de estruturação e funcionamento, dignos para o conselho é condição essencial para a construção do seu papel político-institucional. Um espaço público institucional, como esse colegiado, que não seja eficiente administrativamente, muito dificilmente se torna eficaz: isto é, sem bons resultados administrativos, difícil bom impacto social e político.

Aplica-se aqui o expendido atrás a respeito dos conselhos tutelares, no tocante ao seu papel burocrático.

O apoio administrativo aos conselhos: as chamadas secretarias-executivas - O fortalecimento burocrático dos conselhos depende visceralmente de que tenham, apoiando-os, uma estrutura organizacional pública que lhe dê apoio administrativo. Algo como uma secretaria-executiva dos conselhos dos direitos da criança e  do adolescente.

Normalmente, as leis de criação desses conselhos trazem a previsão de algo semelhante. Ou particularmente criando uma secretaria executiva do conselho dentro da estrutura organizacional do órgão de vinculação (ver atrás),  ou especificando que determinada repartição preexistente funcione como secretaria-executiva ou determinando que o órgão público de vinculação do conselho (ministério, secretaria de estado ou do município, gabinete do chefe do poder executivo etc.) faça esse papel de maneira genérica, deixando a matéria para ato regulamentador.

Espaço político de poder - Mas, a autoconstrução como "espaço político de poder "  deve ser a grande tarefa, no momento, dos conselhos dos direitos da criança e do adolescente, dos seus conselheiros. E da sociedade civil organizada, de maneira mais especial[37]. Estrategicamente, na atual conjuntura, esse é o objetivo mais urgente e importante a ser alcançado!

Ele precisa construir urgentemente sua proatividade, sua participação protagônica nas discussões e nas deliberações a respeito do atendimento dos direitos de crianças e adolescentes: real e efetivo "espaço político de poder". E não, apenas fortalecedor e legitimador de outras instâncias públicas. Precisa ter luz e brilho próprio!

E tal "poder político", ele adquire, quando se abre para a sociedade, ouvindo-a e possibilitando a sua participação, a explicitação dos conflitos de interesses entre classes sociais, entre categorias, gerações, gêneros, orientações sexuais, regiões, etnias, raças etc. Igualmente, tal poder ele adquire quando passa a ser ouvido pelo governo, possibilitando a democratização real do regime político,  o respeito aos conflitos explicitados. SEDA lembra que os conselhos de direitos são "exatamente onde o governante se encontra com os governados para, juntos, conferirem se o ato de governar provoca desvios ou correção de desvios entre realidade e s normas escolhidas pelo país para reger a infância e adolescência”.[38]

Estratégias! os conselhos dos direitos da criança e do adolescente precisam assumir que é preciso se fortalecer como núcleo estratégico-conceitual. Urge que se torne, nesta estratégia de luta, mais “tanque-pensante", que "tanque-combatente". Dentro dessa ótica, tais conselhos poderão exercer um rico papel na potencialização estratégica das políticas públicas, valorizando a sua qualidade: em termos concretos é isso que objetiva também o torna-se "espaço de poder político". E essa “potencialização e valorização estratégica” ocorrem, quando ele se faz "instrumento de articulação e coerção" e  "instância de mediação".

Instrumentos de articulação e coerção  - Essa sua capacidade de "articular politicamente", de maneira ampla, os diversos atores sociais, com legitimidade reconhecida, se torna uma importante estratégia. E a partir dessa "articulação política" efetiva, nasce-lhe a capacidade de propor e fomentar "integrações operacionais" para enfrentar determinadas situações emergentes e pontuais[39].

Há que se construir, como decorrência desse processo de articulação/ integração, por meio desses conselhos principalmente, a necessária intersetorialidade das políticas públicas, num corte transversal sobre todas elas (institucionais, sociais e econômicas), para garantir a prioridade absoluta do atendimento dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes.

Além disso, o conselho dos direitos da criança e do adolescente precisa fazer valer politicamente sua coercibilidade, isto é, a capacidade de fazer respeitadas suas deliberações vinculantes, pelo estado. E isso não é  apenas uma questão técnico-jurídica, é uma questão político-institucional, a ser construída dentro daquela correlação de forças e na conjuntura atual.

A terceira estratégia para se construir um conselho dos direitos da criança e do adolescente, como "espaço político de poder", é sua transformação em "instância de mediação", como se verá adiante. Essa, a mais importante das três.

A esse respeito, leia-se atrás o que se disse a respeito, quando se analisavam os conselhos tutelares – perfeitamente aplicável aos conselhos dos direitos, também.

           Assim, da mesma maneira que os conselhos tutelares, os conselhos dos direitos da criança e do adolescente podem perfeitamente se construir politicamente como tais "instâncias de mediação", pluralistas e hegemonizadoras, em favor dos interesses priorizáveis da infância e da adolescência. Mas, só teremos um conselho dos direitos da criança e do adolescente, com capacidade real de "mediatizar" nesses moldes, se esses colegiados incorporarem, em princípio, uma sociedade civil forte, organizada/mobilizada, política e tecnicamente qualificada, realmente participativa. E nesse jogo, os fóruns, frentes e demais instâncias não institucionais da sociedade têm um rico papel a exercer, verdadeiramente de "direção cultural", de formação de quadros para as diversas organizações sociais, fortalecendo principalmente aquelas que têm compromissos reais com as lutas emancipatórias.

Para que seja possível essa "mediatização" apontada,  a sociedade civil  (na vigente conjuntura, tentando modificar a correlação de forças estabelecida) deverá :

ü    fazer crescer seus níveis de organização/organicidade e de mobilização;

ü    qualificar suas demandas e

ü    assumir politicamente os interesses da população infanto-adolescente, para fazê-los valer como direitos (indisponíveis e exigíveis)  e como dever do Estado.

Além do mais, isso só acontecerá igualmente[40], se esses colegiados incorporarem, de outra parte, uma participação governamental preocupada em construir um real estado democrático de direito, através da participação da sociedade.

Para que seja possível essa "mediatização" apontada, da mesma forma,  o governo  (na vigente conjuntura, tentando ser sensível a essa modificação na correlação de forças estabelecida, em favor dos interesses dos mais necessitados) deverá:

ü    fazer crescer seus níveis eficiência, eficácia e efetividade político-administrativa;

ü    qualificar e atender as demandas da  sociedade e

ü    incorporar politicamente os interesses da população infanto-adolescente, para fazê-los valer como direitos  e como dever seu.

Um conselho de direitos da criança e do adolescente não é um fim em si mesmo. Ele existe para :

ü    satisfazer as necessidades básicas (saúde, educação, segurança alimentar, assistência social etc.) da infância, atendendo-as como direitos fundamentais (sobrevivência, desenvolvimento e proteção);

ü    elevar os índices de desenvolvimento humano de uma sociedade, da população do estado e mais especificamente do seu segmento infanto-adolescente;

ü    fortalecer o processo de fortalecimento da democracia, através principalmente da descentralização político-administrativa e da participação da população.

Tendo esse quadro como pano-de-fundo, os conselhos dessa natureza deverão exercitar, em concreto,  suas funções políticas.



A FUNÇÃO DE POTENCIALIZAÇÃO ESTRATÉGICA DO SISTEMA DE ATENDIMENTO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E DE VALORIZAÇÃO DA QUALIDADE DO DESENVOLVIMENTO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS



Uma questão preliminar: a complementação das normas do Estatuto, no que diz respeito  às atribuições dos conselhos dos direitos da criança e do adolescente[41]  - Os conselhos dos direitos da criança e do adolescente, nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente, como se verá nos capítulos próximos, têm como atribuições legais mínimas (artigo 88 - Estatuto da Criança e do Adolescente):

q    controlar as ações governamentais e não governamentais e

q    formular a "política de atendimento dos direitos da criança e do  adolescente" (artigo 86 – idem).

Todavia, tanto a lei federal que criou o CONANDA, quanto as leis estaduais e municipais que criaram seus conselhos dos direitos da criança e do adolescente instituem novas atribuições complementares ou explicitadoras, de relação às atribuições mínimas estabelecidas exemplificativamente (não, taxativamente) no Estatuto.

E poderiam fazê-lo, uma vez que a Constituição federal estabelece que a competência para legislar sobre "proteção da criança e do  adolescente" é da União e dos estado, concorrentemente; competindo á União apenas a expedição de normas gerais.

Além do mais, por respeito  ao  princípio  federativo, compete á União, aos estados e aos municípios, respectivamente, legislarem autonomamente sobre sua organização administrativa e à União e aos estados sobre sua organização administrativa,  judiciária e público-ministerial.

Ora, realmente o conselho dos direitos da criança e do adolescente é um dos órgãos responsáveis pela proteção integral, integrando o "sistema de garantia dos direitos da infância e da adolescência": matéria da legislação de proteção da criança e do adolescente[42].

E, ao mesmo tempo, um órgão público vinculado à administração pública, federal, estadual e municipal: matéria da legislação administrativa.

Assim sendo a regulação da sua estruturação, organização e funcionamento deverá ser através das leis respectivas, que inclusive poderá estabelecer novas atribuições que não colidam com a missão institucional dos conselhos, invadindo áreas de atribuições e competências de outros órgãos públicos estabelecidas em lei próprias.

Dentro dessa linha, por exemplo, a lei federal 8.242, de 12 de outubro de 1991, amplia aquelas atribuições enumeradas no Estatuto, de relação ao Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente - CONANDA. O artigo 2° dessa lei citada estabelece no seu inciso III que compete a esse colegiado federal   dar apoio aos conselhos estaduais e municipais  dos direitos da criança e do adolescente, aos órgãos estaduais, municipais e entidades não governamentais para tornar efetivos os princípios, diretrizes e os direitos estabelecidos na lei 8.6069, de 13 de julho de 1990" . No inciso VIII do mesmo artigo fala da competência para  "apoiar a promoção de campanhas" etc.

Igualmente, quando se trata, por exemplo, do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente do Ceará - CEDCA/CEARÁ, a lei estadual 11.889, de 20 de dezembro de 1991, cria novas atribuições para esse colegiado, como a do inciso IX do artigo 2: "realizar anualmente audiência pública para fins de prestação de contas das atividades desenvolvida" .

Essas citações exemplificativas, indicam  que o Estatuto não esgota a legislação de proteção á criança e ao adolescente, nem a legislação de organização administrativa e judiciária da União, dos estados e dos municípios: ele só podia dispor sobre normas gerais de proteção à infância e de organização administrativa e judiciária. Fora disso, estaria invadindo a competência das demais esferas se dispusesse sobre normas específicas. Só as leis estaduais e municipais, [43], podem dispor sobre essas normas específicas, complementando o Estatuto.

Algumas vezes, sente-se ou uma "sacralização" ou uma “demonização"  das normas do Estatuto, por parte de alguns aplicadores do mesmo. Nem tanto ao ar.. nem tanto ao mar...!

Politicamente, há que se lutar pela efetivação do Estatuto multicitado e da Convenção sobre os Direitos da Criança, por consagrarem ambos os princípios da doutrina da proteção integral. Mas, juridicamente, temos que aplicá-lo, levando em conta certas limitações suas, decorrentes do fato dele integrar a ordem jurídica nacional, como uma lei ordinária federal que estabelece normas gerais concorrentes e comuns, no tocante à legislação de proteção à criança e ao adolescente e à legislação administrativa.

As atribuições complementares estratégicas: a potencialização de políticas, com valorização de sua qualidade - As leis estaduais e municipais de criação dos conselhos dos direitos, em suas esferas respectivas, podem (e devem!) atribuir aos colegiados de suas esferas, certas funções que chamaríamos de:

ü  potencialização estratégica do desenvolvimento de políticas públicas em favor da infância e da adolescência e 

ü  valorização da qualidade das ações dessas políticas".[44]

Ora, a chamada “potencialização e valorização estratégica” implica em se  construir e desenvolver estratégias políticas consagradas: mobilização social, defesa política de interesses (advocacy), apoio institucional, "empoderamento do usuário" (empowerment), monitoramento e avaliação, articulação / integração, parceria, construção de competências etc. etc.

Assim sendo, importante que essas leis estaduais, que estabelecem normas especiais complementares das normas gerais do Estatuto, criem atribuições para os conselhos dos direitos que contemplem essas linhas estratégicas, fazendo-os, não só (a) controladores de ações (como exclusivamente determina o Estatuto) e (b) formuladores de políticas, mas também potencializadores estratégicos de políticas (na forma que as leis estaduais e municipais dispuserem), valorizando a qualificação dessas políticas.

Características da potencialização estratégica - Potencializar estrategicamente uma ação pública, um programa/serviço, uma política pública, não significa desenvolver (formular, coordenar, executar, controlar) essa ação, essa política : são duas coisas distintas, mas articuladas, que quando confundidas levam a maus  resultados. Nessa linha da potencialização estratégica de políticas e de valorização da sua qualidade, a intervenção dos conselhos dos direitos da criança e do adolescente aparece como uma intervenção pontual, episódica, conjuntural.  E não uma intervenção sistemática, contínua e permanente, que ocorre em decorrência do desenvolvimento de uma política em si, isto é, como atividade da execução da própria política[45].

Como potencializador estratégico, o conselho atua para deflagrar um processo de reordenamento normativo, de reordenamento institucional e de melhoria da atenção direta à criança e ao adolescente, de outras instâncias públicas. Ele se torna um elemento catalisador externo: start-line.

Articulações e integrações: parcerias - Os conselhos dos direitos da criança e do adolescente têm uma função política primordial como potencializador estratégicos das políticas de estado: a construção de parcerias, em nível amplo da articulação ou em nível pontual das integrações operacionais. Típicos dessa linha são os pactos e as agendas-mínimas, construídos a partir do trabalho de articulação/integração dos conselhos dos direitos da criança e do adolescente, junto aos órgãos governamentais, aos órgãos legislativos, judiciários e público-ministeriais, às entidades sociais, aos partidos políticos,  às igrejas (suas pastorais e ministérios), ao meio empresarial e sindical etc.  Principalmente, pactos e agendas temáticos: trabalho infantil, violências estrutural/social e institucional, abusos sexuais, conflito com a lei, situação de marginalização na rua, diversidade/tolerância, desenvolvimento infantil necessidades especiais, aleitamento materno, qualidade da educação, protagonismo adolescente-juvenil etc. etc.

Valiosíssimos instrumentos de articulação são também as "conferências dos direitos da criança e do adolescente", quando se cria espaço e momento para que um número amplo de atores governamentais e não governamentais participe, se articule amplamente: independentemente se do executivo, legislativo ou judiciário, se da União, da unidade federada ou do município, se governamental ou não governamental, se da área específica da "política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente" (Estatuto cit.) ou não.

As conferências são o grande espaço para a construção de diagnósticos e de cenários, os mais legítimos possíveis, da realidade do atendimento dos direitos da criança e do adolescente, em qualquer área. são elas o rico espaço para que daí surjam indicativos para o trabalho de normatização/formulação e de controle de políticas públicas pelos conselhos dos direitos. se não tem essas conferências poder deliberativo legal, como os conselhos estatais, têm elas esse poder de potencializador estratégico, do qual aqui se fala.

Os conselhos dos direitos da criança e do adolescente precisam construir seu protagonismo nesse campo da pactuação social, evitando que seja colocado de lado no processo, como mais um ator secundário: a proatividade deve ser dele.

Outro ponto onde podem eles exercitar esse seu papel potencializador estratégico: no trabalho preliminar de negociação (articulação), com os atores sociais responsáveis e potenciais, para possibilitar a posterior institucionalização de "centros integrados de atendimento inicial". Por exemplo, espaços públicos institucionais, para atendimento inicial do adolescente ao qual se atribui a prática de ato infracional[46], para atendimento das situações emergenciais de vulnerabilidade e/ou desvantagem social (abandono, desaparecimento etc.)[47] .

As possibilidades de desenvolvimento de ações estratégico-potencializadoras e valorizadoras da qualidade de políticas públicas, nessa linha da construção de parcerias, são vastíssima. mas, dependendo elas de uma "definição de estratégias", a análise da situação do município ou do estado, é que melhor indicará os pontos nevrálgicos a serem enfrentados.



Mobilização social: imaginário e processo -  Mobilizar é “convocar vontades para atuar na busca de um propósito comum, sob uma interpretação e um sentido também compartilhados"[48]. Garantir prioritariamente que se nutra, se atenda à saúde, se eduque e se proteja da violência, o público infanto-adolescente – esse o "propósito comum", a bandeira convocatória, agenda-mínima pactuável e mobilizadora.

A satisfação das necessidades básicas de crianças e adolescentes e de suas famílias, enquanto direitos seus como cidadãos e como dever do estado, através da promoção desses direitos por um conjunto articulado de ações públicas (desenvolvimento de políticas públicas) e através da defesa desses  direitos (administração de justiça) – "a interpretação e o sentido", a serem compartilhados por todo o povo brasileiro.

A elaboração dos ante-projetos e do projeto de lei, referentes ao Estatuto da Criança e do Adolescente e seu processo de elaboração legislativa no Congresso Nacional são exemplos ricos do sucesso desse processo de mobilização social, a serviço dessa causa, desse propósito, desse sentido[49]

Mas, como se estruturar e planejar um processo convocatório-mobilizatório desse tipo, construindo esse "propósito comum" e fazendo compartilhada tal "interpretação e sentido"? E que papel poderia desempenhar um conselho dos direitos da criança e do adolescente nesse processo?

A formulação de um imaginário - Os conselhos dos direitos da criança e do adolescente, no desempenho desse seu papel político-institucional[50], precisa fomentar a formulação de um imaginário convocante, no seio da opinião pública, a respeito do "atendimento dos direitos das crianças e dos adolescentes": uma utopia histórica, verossímil e alcançável, que sintetize os grandes objetivos/metas que se quer alcançar e os seus processos. Nesse ponto, não se deve ser apenas racional, mas igualmente ser capaz  de despertar a paixão: - "A razão controla, a paixão move"[51]. Aliás, uma frase clássica melhor define tudo isso: - "Quando um sonha, é apenas um sonho, mas quando dois ou mais sonham, é começo de realidade".

Reconhecido que nos encontramos num processo de transição paradigmática,  como se está nesse campo da infância, passando-se do modelo de estado e direito "regulador", para um modelo "emancipatório"[52] – importa provocar a "reconstrução" do imaginário da sociedade, para que abandonemos o paradigma da tutela protetiva assistencialista/repressora do "menor em situação irregular" e assumamos como nosso (racional e passionalmente) o paradigma da proteção integral e da garantia dos direitos da criança e do adolescente, enquanto sujeitos de direitos e pessoa em condição peculiar de desenvolvimento. É dentro dessa ótica que se justifica por exemplo o aparente purismo em combater o uso pela mídia principalmente da expressão "menor", pelo que de emblematicamente negativo e perverso representa – é mais que uma questão meramente semântica!  é uma questão estratégica!

Por exemplo, nos seus inícios, o CONANDA sinteticamente propôs, como slogan mobilizador: "Lugar de criança é na escola e na família". E recentemente, definiu como nova bandeira: "Violência é covardia; as marcas ficam na sociedade" [53].

Os slogans  são elementos comunicativos essenciais nesse processo de mobilização social, mas não esgotam o processo de re-elaboração e compartilhamento do imaginário, que é mais complexo, pois deve levar a opinião pública a se questionar também: - "Em que medida o que estou fazendo contribui para alcançar esse objetivo, para provocar essa transição paradigmática? O que mais posso fazer ?"

Atores de um processo de mobilização social: produtor social, reeditor social e  editor -  Nesse processo de formulação de um "imaginário convocante", na mobilização social, atuam Produtores Sociais, Reeditores e Editores. O processo depende do bom desempenho deles, cada qual exercendo bem e articuladamente seus papéis próprios.

Entende-se por "Produtor Social", num processo de mobilização social, a instituição que tem a capacidade de criar condições econômicas, institucionais, técnicas e profissionais para que esse processo ocorra. O "Produtor Social" é responsável por viabilizar o movimento, por conduzir as negociações que vão lhe dar legitimidade social e política. É essencial que ele seja visto não como dono do processo (da campanha, da publicação, do evento), mas como precursor e antena, que reflete ele próprio uma preocupação e um desejo compartilhado por muitos.

Já o "Reeditor Social" é aquela instituição que, por seu papel social ou atribuição legal, tem a capacidade de readequar a mensagem, segundo circunstâncias e propósitos, com credibilidade e legitimidade. É uma instituição que "tem público próprio", que é reconhecida socialmente, que tem a capacidade de negar, transformar, introduzir e criar sentidos novos, provocar transições paradgmáticas. Por exemplo, a escola é uma "Reeditora" ativa e nata. Uma igreja, uma associação comunitária, uma ong, determinadas empresas, um sindicato o são, pela mesma razão. O "Reeditor Social" não é  um multiplicador como nas táticas/técnicas de “construção de competências” (estratégia de "apoio institucional" a ser analisada em seguida): ele amplia e interpreta o conteúdo que recebeu, o transforma, adequando-o ao seu público. Não se trata de repassar conhecimentos, conteúdos, conceitos, habilidades, como na capacitação/treinamento.

Por fim, o "Editor", na mobilização social, é o profissional que faz com que as mensagens se convertam em formas, objetos, símbolos, signos adequados ao campo de atuação do "Reeditor Social" e adequados ao pensamento primal do "Produtor Social", para aqueles dois atores mobilizadores possam usá-los, codificá-los, decodificá-los segundo sua própria percepção.

Assim sendo, parece óbvio que quando se trata de potencialização estratégica de políticas públicas (não desenvolvimento de políticas públicas),via mobilização social, aos conselhos dos direitos da criança e do adolescente se deve reservar o papel de "Produtor Social". 

Como "Reeditores Sociais" deverão atuar os órgãos governamentais e não governamentais, que tem legitimidade e competência naquele campo em que se vai trabalhar.

E como "Editores", determinadas agências de publicidade, empresas jornalísticas, editoras, gráficas, companhias teatrais etc. etc.

Figure-se a seguinte hipótese: um determinado conselho dos direitos da criança e do adolescente, estabelecendo em suas "Diretrizes Gerais para uma Política de Atendimento Integral aos Direitos de Crianças e Adolescentes" (normatização/formulação de políticas)[54] que o "enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes" é uma questão prioritária, decide "potencializar estrategicamente e valorizar a qualidade das ações públicas" que interagem nesse campo.

E dentro dessa potencialização/valorização ele se define (dentre outras estratégias) pela mobilização social , em favor da garantia dos direitos a uma afetividade e sexualidade sadia de todas as crianças e adolescentes, protegendo (prevenindo e atendendo) aqueles que sofreram abusos sexuais (violências, explorações, assédios, discriminações etc.) e responsabilizando os violadores. E para tanto, numa linha de prevenção, indica, apoia, assina uma campanha nesse sentido de valorização do exercício do direito e de combate ao abuso do direito. E o faz em parceria por exemplo com outros "Produtores Sociais" típicos, como UNICEF, POMMAR/USAID, Ministério da Justiça, CONANDA etc. 

Essa campanha terá como "Reeditores" aquelas entidades públicas com reconhecida competência técnica e legitimidade social, nesse campo da sexualidade infanto-adolescente: ANCED / CEDECAs, Pastoral do Menor, Ordem dos Advogados do Brasil, Sociedade Brasileira de Pediatria, ABMP, Poder Judiciário, Parlamentos (especialmente suas Comissões de Direitos Humanos), Ministério Público, Ouvidoria Geral, Secretarias de Ação Social (Assistência Social), de Educação, de Cultura, de Saúde, Segurança Pública, Núcleos de Estudo e Pesquisa vinculados (ou não) a Universidades etc. etc.

Os "Produtores Sociais" e "Reeditores" aqui citados, neste caso emblemático,  por sua vez, em conjunto, escolherão os profissionais que atuarão como "Editores": a agência de publicidade que concretizará a campanha referida

O importante que não se misturem os papéis: que não se peça à bananeira que dê uvas! E isso vale para eventos mobilizadores (encontros, conferências, atos públicos etc.), publicações etc. etc.

Apoio institucional: formação de recursos humanos (formação, capacitação / treinamento etc.), por exemplo -  O apoio institucional a órgãos governamentais e não governamentais, na administração pública em geral,  se explicita ordinariamente (tanto como genericamente potencialização estratégica de um serviço ou programa e de uma política, programa e serviço, quanto como restritamente desenvolvimento dessa política, programa e serviço) nas formas seguintes, exemplificativamente:

ü formação de recursos humanos;

ü instalação e equipamentação; e

ü fornecimento de material.

Esta questão da ação estratégica de apoio institucional, da parte dos conselhos dos direitos da criança e do adolescente, beneficiando organizações governamentais e não governamentais, nos remete a uma outra discussão de fundo, que a precede, já tratada sucintamente atrás[55] neste texto: os conselhos dessa natureza não devem coordenar e executar ações públicas: isto é, não devem ser os executores diretos de serviços/atividades e programas/projetos públicos.

Muitas das táticas, técnicas e procedimentos da estratégia de apoio institucional correm o risco de induzir esses colegiados a irem até o ato de execução direta de ações públicas, ultrapassando suas limitações legais e político-institucionais[56]. Assim sendo, o apoio institucional a organismos públicos governamentais e não governamentais, a ser garantido pelos conselhos, deverá ser na ótica da potencialização estratégica de políticas públicas e não do desenvolvimento/execução de políticas públicas.



Formação de recursos humanos - Por exemplo, a "formação de recursos humanos" (no quadro maior do "desenvolvimento de recursos humanos"), como uma das formas mais usuais de “apoio institucional”, deve ter suas atividades permanentes e seus projetos transitórios coordenados/executados por órgãos governamentais e não governamentais próprios: universidades, centros/núcleos de estudo e pesquisa, escolas corporativas de formação[57], ong.s com esse perfil etc. Os conselhos não se equiparam a esses citados: não deveriam desenvolver atividades dessa natureza,  em  nível de coordenação e de execução.

Em resumo: os conselhos dos direitos da criança e do adolescente  são os mentores, os alavancadores, os mantenedores (quando se tratar de financiamentos pelos fundos para os direitos da infância e adolescência). 

Eles podem definir a direção de projetos de capacitação/treinamento ou de reciclagem, aperfeiçoamento e especialização, que um órgão público governamental ou não governamental lhe apresente, como executor. mas não deveria desenvolvê-lo diretamente[58],como muitas vezes acontece, deformando a natureza jurídica e o papel político-institucional desses conselhos.



A FUNÇÃO CONTROLADORA DAS

AÇÕES PÚBLICAS

GOVERNAMENTAIS E NÃO GOVERNAMENTAIS



Acompanhamento / monitoramento & avaliação – Aqui está o coração dos conselhos dos direitos da criança e do adolescente: sua função controladora, isto é, seu papel de monitoramento das ações públicas em favor da promoção dos direitos humanos da infância e da adolescência.

Os conceitos de monitoramento & avaliação são bastante difundidos na terminologia empregada na execução de projetos, especificamente. E de maneira mais ampla, no desenvolvimento de políticas públicas. Eles significam que dada "situação" é observada (monitoramento) para que posteriormente ou simultaneamente no processo,  possa ser efetuada uma apreciação detalhada e uma validação dos dados obtidos (avaliação).

O monitoramento compreende a observação e documentação sistemática da implementação de uma política, de um programa/serviço, de um projeto/atividade, com base no planejamento.

A avaliação compreende a avaliação interna das informações e dos dados colhidos na monitoria, considerando sua conformidade com os objetivos e atividades planejados.

Essa apreciação acerca da adequação dos instrumentos e dos meios de execução e da factibilidade de alcance dos objetivos é a base para a tomada de decisão política no gerenciamento do projeto, no aperfeiçoamento do programa – na potencialização estratégica e na valorização da qualidade das do desenvolvimento políticas públicas.



Assim sendo, monitoramento & avaliação podem ser vistas como instrumentos de apoio ao processo contínuo de controle das ações públicas a ser desempenhado

O registro de entidades e de programas - Compete aos conselhos municipais dos direitos, exclusivamente (a) proceder o registro de certas entidades públicas e (b)  proceder além do mais o registro da inscrição de determinados programas públicos. Não se trata de mero registro cartorário, formalista. E sim de um procedimento de controle.

De um lado, aos conselhos municipais dos direitos compete o trabalho de acompanhar, avaliar e autorizar o funcionamento de entidades públicas não governamentais que desenvolvam programas socioeducativos e de proteção social, elencados no artigo 90 do Estatuto da Criança e do Adolescente: a existência jurídica da entidade não depende dessa decisão do Conselho, mas o reconhecimento dela como executora especificamente da política de atendimento de direitos fundamentais da criança e do adolescente, sim. Já os órgãos públicos governamentais, para sua instituição, dependem de lei autorizativa – decisão adotada em nível de normatização superior ao do Conselho.

Por sua, de outro lado, aos conselhos municipais dos direitos compete igualmente o trabalho de acompanhar, avaliar e autorizar o desenvolvimento de programas socioeducativos e protetivos, tanto por parte de  instituições públicas governamentais, como não governamentais.

Correição e o dever de representação às instâncias próprias - O papel controlador dos conselhos dos direitos da criança e do adolescente não deve se esgotar com o monitoramento (acompanhamento e avaliação). Ele deve levar esses Conselhos a um verdadeiro papel correicional, no seu sentido mais amplo:

ü Orientar e prover de dados, informes e análises

ü Indicar  ou solicitar correções no desenvolvimento de ações públicas;

ü Representar pela responsabilização de agentes públicos.

Constatada a ocorrência de uma violação aos direitos da criança, não atuará o conselho dos direitos - dentro no Sistema de Garantia dos Direitos da Criança -  propriamente como atores sociais, na linha da Defesa de Direitos, como fariam os conselhos tutelares, os órgãos do poder judiciário, do ministério público e da segurança pública, os defensores públicos, as entidades de defesa[59]. Isto é, não atuariam diretamente garantindo a indisponibilidade, a imprescindibilidade, a exigibilidade dos direitos de crianças e adolescentes, "credores de direitos".

Constatada essa violação de direitos, como atividade administrativa ainda, na linha da "Promoção de Direitos", caberia aos conselhos dos direitos encaminhar o caso às autoridades competentes, dando-lhes notícias do fato violador, que poderá, em algumas vezes, se configurar como crime ou como infração administrativa (cf. Estatuto citado).

Muitos acusam o Estatuto de não ter "armado" os conselhos dos direitos para garantir a exigibilidade de direitos da criança e do adolescente. Mas esquece-se que o Estatuto desenha uma verdadeira e salutar "rede de incompletudes institucionais", onde um ator social complementa o outro: nos salvando do perigo das "instituições totais",  que tanto mal causaram no passado.

Os conselhos dos direitos, como integram essa "rede", têm que tomar consciência de sua "incompletude institucional" e, em casos desses, acionar outros atores sociais que possam dar conta dessa tarefa. Eles precisam exercer mais essa sua função controladora, ainda muito pouco explicitada na prática, muito pouco explorada, lamentavelmente.

Controle dos procedimentos de escolha dos conselheiros tutelares - Esta ficou como uma atividade especial dos Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente[60] de discutível definição de sua natureza jurídica e política: organizar e presidir os procedimentos de escolha dos conselheiros tutelares. E o faz, não tanto numa linha de gestão de meios[61], mas de controle do poder/atribuição do Poder Executivo municipal, de investir agentes públicos.

De ordinário, há certa dificuldade de se entender a natureza dessa intervenção dos Conselhos dos Direitos, que a primeira vista parece discrepar das suas demais atividades, dentro do espectro geral das atribuições desses colegiados municipais.

Realmente,  tem-se reconhecido que – em função dos seus papéis jurídico-legal e político-institucional, como visto atrás -  os conselhos dos direitos não devem assumir nenhuma função de execução de política pública, isto é, desenvolver atividades (através de um determinado serviço público) ou projetos (no bojo de um programa público): isso ficou bastante claro!

Assim, essa sua função de organização e presidência do processo de escolha dos conselheiros tutelares (que lhe foi atribuída posteriormente) precisa encontrar seu nicho jurídico e político-institucional.

E aqui se propõe que seja no campo do controle das ações públicas[62], como acima justificado – pelo menos de maneira didática, mesmo que se reconhecendo que assim se fará de maneira bem pouco ortodoxa.

Histórico, justificativa e procedimentos – Esta matéria já foi tratada atrás no capítulo referente aos conselhos tutelares.



A FUNÇÃO NORMATIZADORA DO

DESENVOLVIMENTO DE POLÍTICAS PÚBLICAS



Generalidades – Para que os conselhos dos direitos da criança e do adolescente possam exercer sua função primordial de controle (monitoramento)  das ações públicas de promoção dos direitos humanos importa que ele previamente estabeleça certos paradigmas, certas diretrizes que sirvam como matriz para o trabalho de monitoramento – o “contraste”. Para tanto, se torna da máxima importância que esses conselhos normalizem, em determinado nível, a política de promoção dos direitos humanos da infância e da adolescência e os seus programas e serviços.

Natureza: atos administrativos regulamentares - Compete em princípio ao poder legislativo, através da lei, criar a norma jurídica  -  normatizar, positivar o Direito. Mas o papel normatizador do estado não se esgota com a atividade legisferante. Existem outros níveis do poder normatizador que são exercidos, inclusive,  pelo Poder Executivo: por exemplo, o ato regulamentar.

Assim, o poder executivo não só aplica o Direito, mas o cria. Faz parte do processo de desenvolvimento das políticas públicas, a normatização administrativa, isto é, a formulação dessas políticas, a definição de diretrizes.

Os conselhos dos direitos da criança e do adolescente são parte nesse processo de desenvolvimento das políticas de estado, ao normatizar o desenvolvimento da chamada  "política de atendimento dos direitos de crianças e adolescentes" [63]

O Estatuto lhe dá poder “deliberativo” e não consultivo. Seus atos têm pois poder vinculante, como norma jurídica.

Conteúdo: diretrizes gerais para o desenvolvimento das políticas públicas -  Quando o Estatuto vê os conselhos dos direitos da criança e do adolescente como "deliberativos"[64], na verdade se refere ao seu poder de deliberar  a respeito de políticas públicas; como complementam as leis federal, estaduais e municipais de criação desses colegiados. E, dentro do processo de desenvolvimento das políticas de estado, quando um órgão administrativo delibera a respeito, o faz formulando essa política, regulando-a, normatizando-a administrativamente: formulação normativa de diretrizes gerais para a garantia, com prioridade absoluta, dos direitos fundamentais à sobrevivência, ao desenvolvimento e à proteção[65] da criança e do adolescente.

No tocante a esse poder deliberativo de formulação/normatização da política de atendimento dos direitos fundamentais da criança e do adolescente[66], preliminarmente, há que se ressalvar e distinguir o seguinte: não compete aos conselhos dos direitos o planejamento dessa política (ou de qualquer outra...), como forma de desenvolvimento de políticas públicas, uma vez que o planejamento já é parte da execução das políticas.

Essa sua intervenção está numa fase precedente, como "normatizador": isto é, numa linha de definição de diretrizes gerais para o planejamento, coordenação, execução e controle.

A lei federal que criou o CONANDA estabelece que  a "formulação de política" é uma de suas funções básicas. E as leis estaduais e municipais que criam, em suas esferas, os respectivos conselhos desse sistema repetem essa orientação, melhor explicitando o Estatuto.

Normatizador/formulador de que ramo das Políticas de Estado? - Todavia, a questão verdadeiramente polêmica, no tocante a esse papel específico dos conselhos dos direitos da criança e do adolescente, reside na delimitação da abrangência da intervenção  normativa desse conselhos: isto é, normatizador/formulador de que ramo das políticas de estado? de que tipos de programas/projetos e serviços/atividades? Ou mesmo: normatizador/formulador não só do desenvolvimento de políticas públicas, mas de outros campos da atividade estatal (função judicante, por exemplo)?!

Ora, o Estatuto prevê, no seu artigo 86, o desenvolvimento de uma "política de atendimento de direitos da criança e do adolescente".  Isto é, uma política de promoção dos direitos e liberdades fundamentais da criança e do adolescente; uma ação sistemática defesa (promoção e proteção) dos direitos humanos desse segmento social. Assim sendo, em princípio, os conselhos referidos seriam responsáveis por essa política nomeada.

Obviamente, não se trata aqui de nenhuma política setorial, como as políticas sociais básicas (educação, saúde, assistência social, cultura etc.). Mas sim de uma política intersetorial, a cortar transversalmente todas as políticas públicas, para assegurar que a satisfação das necessidades básicas desse segmento da população seja  reconhecida e garantida como direitos fundamentais, prioritariamente; obedecidos mais determinados princípios. Dessa maneira, é realmente  absurda a confusão que muitos ainda fazem entre essa "política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente" (Estatuto e conselhos dos direitos, citados) e a "política de assistência social".

Puro ranço da velha "doutrina da situação irregular", na qual se fundamentava o revogado Código de Menores, onde o assistencialismo e a repressão eram seus dois pilares. Só que a atual política de defesa, promoção e proteção dos direitos humanos se firma na doutrina agora da "proteção integral". E enquanto isso a assistência social constrói um novo caminho de negação do clientelismo, do primeiro-damismo, do assistencialismo.  Novos paradigmas para ambas.

Alguns querem reduzir simplesmente o Estatuto e os conselhos dos direitos da criança e do adolescente a meras "especializações" da Lei Orgânica da Assistência e dos conselhos de assistência social. Como se os primeiros tratassem apenas de um setor da assistência social: o das crianças e adolescentes vulnerabilizados ou em situação de risco pessoal e social. Enquanto os conselhos de assistência social seriam mais genéricos, mais abrangentes.  Ora, o Estatuto da Criança e do Adolescente não permite tal visão corporativa, reducionista e equivocada da abrangência de ação dos conselhos dos direitos. Na verdade, não se trata de um ter prevalência sobre o outro ou concorrer com o outro. E sim realmente de abrangência.

Os conselhos intersetoriais (como os dos direitos da criança, o da mulher, o da condição negra, o dos portadores de deficiência etc.) têm  uma abrangência bem maior que qualquer dos conselhos setoriais (saúde, educação, assistência social) : existem em função de todas as crianças e todos os adolescentes, sem cortes.  Mas, não uma importância maior, pois suas funções são bastante díspares, sem confusão, superposição e concorrência.

Programas de proteção a crianças e adolescentes que dela necessitem (vulnerabilizados, por exemplo) existem em qualquer das políticas sociais e das políticas institucionais[67] – inclusive e principalmente no campo da  política de assistência social. Mas, programas e atividades não se confundem com políticas, no seu sentido amplo e puro – e sim as integram como partes.

Desse modo, por exemplo, toda forma de exploração laboral da criança e do adolescente [68] deverá se prevenida, erradicada, proibida e eliminada, através de serviços/atividades e programas/projetos de proteção, articulada  e  integradamente, umbicados  nas políticas de saúde, de educação, de assistência social, de defesa da cidadania[69], de segurança pública, de agricultura, das relações exteriores etc. A erradicação do trabalho infantil no Brasil não é uma questão puramente de assistência social. Mas, o é também...

Essa concepção mais ampla, intersetorial, transversal e universalista do Estatuto da Criança e do Adolescente e dos seus conselhos dos direitos tem raízes históricas: quando da criação originariamente do CONANDA ele foi vinculado ao Gabinete da Casa Civil da Presidência da República, nessa linha de articulação. Posteriormente, foi vinculado por pouco tempo ao Ministério do Bem Estar Social, por força da vinculação a esse ministério de estado da extinta Fundação CBIA[70]. E quando esse ministério passou a assumir especificamente apenas duas políticas da seguridade social (previdência e assistência social), extinguindo-se inclusive a Fundação CBIA - foi ele transferido para o Ministério da Justiça, enquanto espaço público federal, responsável pelas políticas institucionais de defesa da cidadania [71].

Nos estados e municípios, essa vinculação administrativa dos conselhos dos direitos da criança e do adolescente reflete o modo como, ali, concretamente, todas essas políticas públicas se institucionalizam, se estruturam, se organizam: os conselhos dos direitos estão ora em secretarias de justiça e cidadania ( ou direitos humanos), ora em secretarias de segurança pública, ora em secretarias de desenvolvimento ou ação social, ora nos gabinetes dos chefes do poder executivo etc. etc. A conjuntura local dirá qual a melhor vinculação administrativa, levando-se em conta uma série imensa de variáveis: de qualquer maneira, a melhor solução está na vinculação a um ministério, secretaria estadual ou municipal ou outro órgão público que tenha maior abertura para as políticas inter-sectoriais, que tenha maior capacidade de articulação interinstitucional e que tenha realmente força política.

O que interessa - no caso da definição do campo de ação dos conselhos dos direitos da criança e do adolescente, como normatizador/formulador de política - é que não se confunda esse campo com nenhum outro e se reconheça a especificidade desses conselhos intersetoriais, no formular normativamente diretrizes gerais para a garantia, com prioridade absoluta, dos direitos fundamentais à  sobrevivência, ao desenvolvimento e à proteção especial” [72] da criança e do adolescente.

Normatizador/formulador para além das Políticas de Estado? - Fora desse campo do desenvolvimento de políticas públicas, surgem algumas dúvidas sobre a possibilidade dos conselhos dos direitos formularem/normatizarem  a prestação jurisdicional ("administração de justiça à população") e a organização e funcionamento do poder judiciário ou o exercício da função de custos-legis e a organização e funcionamento do ministério público. há possibilidades desses conselhos formularem/normatizarem outras atividades estatais fora do âmbito da administração pública?  isto é, possibilidade de estabelecerem regras, diretrizes para o funcionamento do poder judiciário e do ministério público, por exemplo !?

A tese, de início, encontra resistência nos princípios constitucionais, especialmente, na regra maior da separação dos Poderes, da harmonia e independência dos Poderes. Realmente, os conselhos de direitos não podem estabelecer nenhuma diretriz que obrigue, de alguma forma, os órgãos dessas citadas Instituições soberanas do estado e que tem seus órgãos superiores de controle e formulação de suas políticas (CNJ, CNMP, CNDP).

Por exemplo, tais conselhos deliberativos podem estabelecer diretrizes para regular administrativamente a execução por parte da administração pública, de medidas socioeducativas aplicadas a adolescentes autores de ato infracional[73]. Mas, não podem estabelecer nenhuma norma reguladora do procedimento processual de aplicação essas medidas pelos juizes da infância e da juventude (poder judiciário) -  pena de mera negativa de vigência dessa norma pela Instituição "invadida", como ato inexistente.

Por exemplo, seria estranho ao modo de ser, constitucional e legal, dos órgãos judiciais e público-ministeriais, que se tentasse - por essa via - definir uma pretensa melhor interpretação para um determinado dispositivo do Estatuto, para efeito de sentença, despacho ou  parecer.

Como seria também estranhável uma norma administrativa emanada de conselhos tais, que pretendesse mais a "uniformização de condutas de magistrados", ou a aplicação judicial de medidas socioeducativas a adolescentes infratores, ou a regulação do funcionamento das comissões estaduais judiciais de adoção, ou a regionalização e a especialização de órgãos judiciais e de representações do ministério público etc. São matérias a serem enfrentadas ou por atos administrativos regulamentares dessas próprias Instituições ou por leis estaduais (organização judiciária e público-ministerial) e federais (direito processual, direito civil, organização judiciária e público-ministerial etc.).

Aos órgãos normativos e correicionais, internos, próprios e competentes do poder judiciário e do ministério público (conselhos superiores, corregedorias gerais, presidências de tribunais, procuradorias gerais  – p.ex.), é que compete cumprir seu trabalho de estabelecer diretrizes programáticas, de regulamentar o exercício das funções jurisdicionais e público-ministeriais, no âmbito de suas instituições[74] - de ofício ou por provocação dos conselhos dos direitos, quando for o caso[75].

Mutatis mutandi, igualmente contrárias à lei – pelas mesmas razões – são as invasões de atribuições dos juizes da infância e da juventude e dos promotores de justiça correspondentes, quando resolvem formular/normatizar o desenvolvimento de políticas públicas, através portarias e outros atos administrativos – fora do âmbito estrito do permissivo do Estatuto[76].

O velho paradigma da doutrina da situação irregular ainda influencia o decisório de alguns membros do judiciário e do ministério público, fazendo-os "gestores públicos" e "legisladores". Em função disso, emitem atos genéricos, estabelecendo  formas de ação pública social-assistencial de relação a crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social ("operação-arrastão" dos chamados meninos de rua, p.ex.). Intervêm como "superiores administrativos hierárquicos", na gestão de órgãos administrativos do poder executivo, (unidades socioeducativas, abrigos, p.ex.). Praticam verdadeiros atos de supervisão administrativa dos conselhos tutelares, fazendo-os funcionar sob ordens ou por delegação, participando indevidamente do seu procedimento de escolha como se fora um "processo eleitoral" etc.[77]

Uma coisa é o exercício de suas funções legais de controle judicial dos atos administrativos e de custos legis, por exemplo, examinando esses atos sob os aspectos da legalidade, economicidade, moralidade, publicidade e impessoalidade. Outra coisa é a pura e simples supervisão ou coordenação administrativa de serviços e programas administrativos.

O relacionamento dos conselhos dos direitos da criança e do adolescente – na qualidade de órgãos autônomos especiais do poder executivo -  com o poder judiciário, com o poder legislativo, com o ministério público, não se faz via normatização, regulamentação, supervisão, de ambos os lados. Mas sim numa linha estratégica de advocacia política (advocacy) e de articulação, ambos apresentando subsídios, indicativos, demandas.

Esse é um campo rico para se construir parcerias e não subordinações. A idéia de um "sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente", funcionando como "rede" , exige isso: menos "chefes" e mais "provedores", menos "focos de poder" e mais "focos de serviço" – parceiros, aliados.

Processos: metodologia, técnicas e procedimentos - São típicas dessa ação de formulação/normatização, pelos conselhos dos direitos:

  • a produção de análises da situação, com diagnósticos conjunturais (avanços e desafios) e com projeção de cenários prováveis (possibilidades) e
  • a definição de diretrizes programáticas, priorizadoras de determinados direitos fundamentais.

Análise de situação  -  A normatização de uma política pública deve ser produzida a partir da análise do contexto social, da realidade social, onde se tentará proporcionar conhecimentos para modificar a realidade, sendo essencial para a elaboração de diretrizes e bases (normas), para o desenvolvimento de políticas públicas, para a execução de planos, programas e projetos. Isso implica primeiramente em se diagnosticar a situação, isto é, descrever, explicar e predizer. 

A descrição diagnóstica caracteriza a realidade que se pretende intervir, modificar: apresenta-a, desvela-a .  Para tanto há que se fugir dos reducionismos científicos,  com uso de taxinomizações de uma única ciência. Cada ramo da ciência tem sua taxinomia[78] própria e se reconhece pelos conceitos que utiliza. Por exemplo, o  “tráfico de pessoas para fins sexuais” pode ser descrito como um tipo delituoso, a ser sancionado penalmente (taxinomia jurídica) ou como uma reificação da relação afetivo-sexual, tornada mercadoria (taxinomia econômica) ou como um pecado a ser condenado e redimido (taxinomia teológica) ou o resultado de uma relação hegemônica de dominação e exploração da mulher e de outros segmentos sociais vulnerabilizados (taxinomia política) e assim por diante. Nesse caso, na descrição do fenômeno tráfico de pessoas para fins sexuais deve-se contemplar todas essas categorias, descrevendo-o como uma situação multifacetária.

A explicação diagnóstica é realizada recorrendo-se a relações causais entre variáveis que condicionam a situação atual e cuja alteração permitirá alterá-la. Trata-se de uma parte fundamental do diagnóstico, desde que na ausência de um modelo causal fica impossível elaborar um projeto de mudanças. Há que se incluir aqui todas as dimensões e variáveis que permitam explicar o fenômeno ou processo que se estuda, que se analisa.

A predição diagnóstica (“cenários”) é resultante da capacidade de se explicar. Se for possível explicar, também o será predizer. E isso se pode fazer através de uma projeção das tendências observadas nas fases anteriores.

Definição de diretrizes gerais, programáticas e priorizadoras - Em princípio -  como da essência do processo de  normatização/ formulação da política de promoção dos direitos fundamentais da criança e do adolescente - se poderia considerar que ele visa estabelecer diretrizes, balizas, regras gerais, normas regulamentares, para o desenvolvimento de tal política intersetorial, isto é, para o planejamento, a coordenação, a execução e o controle-de-gestão dessa política em favor da infância e da adolescência.

Através dessas diretrizes gerais programáticas, os conselhos dos direitos da criança e do adolescente estabelecem os objetivos gerais, as metas prioritárias e as macro-estratégias, para essa política, pela qual têm responsabilidade. E principalmente, devem procurar estabelecer as grandes linhas de articulação política entre as diversas formas de intervenção política do Estado na questão da infância e da adolescência, apontando também para os possíveis sítios de integrações operacionais.

O ideal é que essas normas definidoras de diretrizes programáticas, em concreto, busquem a  sumulação, isto é, que busquem a essencialidade mínima: um número reduzido de objetivos, metas e ações e atividades. E principalmente, estabeleçam indicadores de avaliação da sua eficácia e da efetividade.

Algo na linha das "medidas vitais". Algo que tenha capacidade mobilizadora e que permita um trabalho de advocacia política pelo conselho, no tamanho de suas possibilidades. Algo que leve em conta  questões, por exemplo, como da governabilidade, que leve em conta os recursos orçamentários previstos nas Leis de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Algo mais, nessa linha.

Um trabalho desses de formulação/normatização/priorização não pode ser um elenco desordenado e não avaliado de "desejos", de demandas surgidas de verdadeiras "tempestades-de-idéias". Por exemplo, de um elenco de indicações amplas que as conferências dos direitos das crianças e dos adolescentes façam e de um elenco outro de medidas possíveis que levantem[79] as análises de situações do próprio colegiado - os conselhos dos direitos da criança e do adolescente (no exercício da sua função normatizadora administrativa, de caráter deliberativo)  precisam definir quais delas as prioritárias, para aquele período: na linha de 5 ou 10 diretrizes gerais programáticas, que sejam verdadeiros eixos estratégicos. A depender do nível da formulação/normatização,  esse número deverá ser o mínimo possível no nível nacional, ampliando no nível estadual e podendo chegar a minudências maiores no nível municipal[80].

Via de regra, no país, atualmente ainda, a realidade não mostra esse quadro de concentração e redução de objetivos/metas, aqui defendido. Os atos dessa natureza dos conselhos deliberativos, pelo Brasil a fora, definem 50 ou muito mais diretrizes! Difícil garantir eficácia e efetividade a tão grande número de prioridades. Mas, é importante que isso seja considerado e valorizado como um "exercício inicial" de normatização de diretrizes, a nos levar a um processo de depuração e refinamento, cada vez maior –  não "negar-se" acidamente, mas "superar-se" criticamente, com paciência histórica.

Outro ponto importante diz respeito à questão da multi-setorialidade, da inter-institucionalidade, da transversalidade, que se deveria assegurar como caráter dominante da política de promoção dos direitos humanos da criança e do adolescente"[81] e que, por via de conseqüência, deveria contagiar o processo de formulação/normatização de suas diretrizes programáticas.

Vive-se muito preso aos esquemas tradicionais das políticas setoriais. E quando se pretende formular uma política intersetorial/transversal, continua-se a garantir, internamente nessa política, a autonomia das áreas setoriais (saúde, educação, assistência social etc.), fazendo com que o trabalho de articulação/integração se transforme em mera colagem, justaposição. Os modelos de formulação para essa política específica prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 86) não são os usuais das políticas sociais setoriais. Dever-se-á buscar referências metodológicas para essa formulação/normatização de diretrizes programáticas,  em outras políticas intersetoriais, como a indienígena, a de meio ambiente, a de relações exeteriores etc. etc.

É preciso ousar nesse campo e se estabelecer diretrizes não para áreas de políticas setoriais determinadas, aglutinadas num texto, mas levando-se em conta outros critérios: por exemplo, ciclos de vida[82], focos situacionais[83], eixos estratégicos[84], gerações de direitos fundamentais, cortes geográficos - mesclando critérios, de maneira menos ortodoxa.



O papel normatizador do CONANDA, como referência  -  De maneira referencial para todos os conselhos dos direitos da criança e do adolescente - o CONANDA, por resoluções, define em nível nacional as "Diretrizes gerais para a política de atenção integral à infância e à adolescência nas áreas de saúde, educação, assistência social, trabalho e para a garantia de direitos", priorizando direitos fundamentais desse segmento social.

O primeiro trabalho de formulação consumiu dois períodos de gestão do CONANDA e teve como relatoras inicialmente as conselheiras Vanda Engels Aduan[85] e Maria do Rosário Leite Cintra (Ir.) [86] E posteriormente a Conselheira Zilda Arns Neumann[87], quando da sua versão final. Essas diretrizes foram aprovadas em 04 de outubro de 1995, na 28ª assembléia ordinária do CONANDA e promulgadas por resolução[88].

Em outubro de 2000, o CONANDA reviu suas "Diretrizes Gerais", através de nova resolução, com vigência até 2005.

A parte inicial do documento, como uma “Introdução”, esboça-se um histórico do atendimento à criança e ao adolescente no Brasil, nos seus 500 anos.  E registra-se mais a situação da criança e do adolescente na década de 90, a partir da promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente. Por fim, esse capítulo se encerra com uma análise sobre a “ institucionalidade democrática”  onde são lançadas as bases teóricas da nova “doutrina da proteção integral” e os princípios básicos da nova normativa legal nacional, com menção expressa ao ao chamado sistema de garantia de direitos, que o CONANDA assume como sua tarefa a sua viabilização, em nível nacional.

Finalmente, traça o documento, em concreto, "diretrizes para as políticas públicas", colocando-as no contexto da "garantia do direito à vida e ao desenvolvimento integral". 

Essas diretrizes, em cada área especificada, por exemplo, versam sobre:

§  alojamento conjunto, cartão de gestante, anormalidades metabólicas do recém-nascido, permanência de pais junto a crianças e adolescentes internados, vigilância nutricional, ampliação de recursos financeiros, implantar programas de prevenção de acidentes no lar ou fora dele etc. (saúde);

§  articulação das áreas da saúde, educação e assistência social para atendimento de crianças de 0 a 6 anos, garantia do acesso, regresso, permanência e sucesso na escola, diminuição dos níveis de repetência nas 5 primeiras séries, educação para o trabalho, saúde escolar, atendimento aos portadores de necessidades educativas especiais, aumento progressivo da remuneração do magistério  etc. (educação);

§  erradicação do trabalho infantil, estímulo a programas de geração de renda de caráter familiar, ratificação da Convenção 138 da OIT etc. (trabalho);

§  implantação e fortalecimento de serviços de apoio familiar para crianças e adolescentes em situação de alto risco, entidades de abrigo etc. (assistência social).

Além disso, foram estabelecidas algumas diretrizes especiais para a "garantia dos direitos",  versando, por exemplo, sobre:

§  implementação de conselhos dos direitos da criança e do adolescente e de conselhos tutelares, por meio de sistema de monitoramento;

§  atendimento a adolescentes autores de ato infracional e execução de medidas socioeducativas, com reordenamento e reaparelhamento dos serviços e programas respectivos;

§  implementação dos centros integrados operacionais de atendimento inicial a adolescentes infratores e de juízos regionais da infância e da juventude;

§  implementação de defensorias públicas especializadas;

§  cadastros nas comissões estaduais judiciárias de adoção;

§  fortalecimento das entidades de defesa de direito, especialmente visando diminuir a impunidade por crimes praticados contra crianças e adolescentes;

§  etc.

De qualquer maneira, continuam ainda em grande número as diretrizes nacionais, dificultando sua efetivação e o controle sobre sua eficácia e efetividade. E continuam ainda agrupadas ainda tradicionalmente por áreas setoriais, dificultando o atendimento integral paradigmático.



Uma outra referência metodológica: o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, de Belém (Pará) - Por sua vez, pode-se registrar também como referência metodológica, o trabalho de normatização/formulação da "Política Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente", de responsabilidade do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de Belém (Pará)[89].

O texto original - aprovado posteriormente pela plenária do conselho após profunda discussão - foi elaborado por uma comissão composta de conselheiros, representando a Fundação Papa João XXIII, a Secretaria Municipal do Meio Ambiente e o Conselho Regional de Serviço Social da 1ª Região; assessorados por três consultores externos. Esse trabalho em esboço "consolidava subsídios oferecidos inicialmente pela I Conferência Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, em consonância com as diretrizes elaboradas pelo CONANDA e estudos e reflexões efetivados pelo próprio COMDAC". Finalmente, o texto final foi referendo durante a II Conferência Municipal dos Direitos da Criança e finalmente aprovado formalmente pela plenária do Conselho Municipal, em 1997, para vigorar até 2000.

Essa normatização referenciada vem precedida de uma análise de situação que compreende uma apresentação e avaliação de um quadro  sobre a situação socio-econômica de Belém; contendo 

(a)  um registro descritivo da situação física e da organização administrativa da cidade;

(b) um registro descritivo-avaliativo do processo de exclusão social (processo excludente de ocupação do espaço urbano e processo excludente de organização econômica), que ocorre no município e

(c)  um registro descritivo-avaliativo, bem particularizado, da situação das crianças e adolescentes, frente às políticas sociais (assistência social/proteção especial, saúde, educação, desporto/cultura/lazer).

No tocante à definição em concreto das "diretrizes programáticas" propriamente ditas, o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de Belém inicia, estabelecendo e explicitando seis (6) "princípios fundamentais", que servem de chave-hermenêutica para essas diretrizes e conseqüentemente para toda a política de promoção dos direitos humanos da criança e do adolescente, em Belém, de 1997 a 2000:

§  "Crianças e  adolescentes são sujeitos de direitos";

§  "Crianças e adolescentes são pessoas em condição peculiar de desenvolvimento";

§  "Crianças e adolescentes têm prioridade absoluta";

§  "Articulação e compromisso político entre as esferas de governo";

§  "Articulação entre os organismos executores"; e

§  "Articulação dos Programas e Serviços de Proteção às demais Políticas Sociais".

Finalmente, são estabelecidas as chamadas "diretrizes programáticas" para as áreas da "Proteção Especial", da Assistência Social, da Saúde, da Educação e da Cultura/Deporto/Lazer; definindo-se objetivos-metas e ações-atividades ("medidas"), para cada uma delas.

Essa formulação/normatização do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de Belém conclui definindo ainda:

§  Competência operacional;

§  Período de execução;

§  Recursos;

§  Acompanhamento e controle.



A experiência referencial do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente do Ceará -  Por sua vez, o Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente do Ceará – CEDCA-CEARÁ, em sua última reunião especial de planejamento anual, se propôs a elaborar um "plano de promoção e defesa dos direitos fundamentais da criança e do adolescente no Ceará", estabelecendo assim as diretrizes gerais para a política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente nesse Estado.

Essas Diretrizes Gerais foram aprovadas através da resolução nº 40/2002 do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente do Ceará. Um Grupo de Trabalho, paritário, elaborou uma minuta de "plano", que foi submetido à IV Conferência Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente, para sugestões. Em seguida, foi levado a outros espaços de discussão (secretarias de estado, entidades de classe das categorias profissionais interessadas, conselhos setoriais, entidades de direitos humanos, mídia etc.). Ao final do processo, a plenária do CEDCA-CEARÁ o aprovou formalmente, fazendo-o publicar no Diário Oficial do estado.encaminhando-o ao Governador do Estado para as providências cabíveis.

O texto define como missão maior do estado e da sociedade, no tocante aos direitos fundamentais da infância e da adolescência, na atual conjuntura, no Ceará:

"Articular o desenvolvimento de políticas públicas que priorizem o desenvolvimento integral da criança e do adolescente, como direito e como dever do Estado, da sociedade e da família.  e igualmente defender esse  direito em casos de violações".

A partir daí, foram fixados cinco (5) "Eixos Direcionais Estratégicos", em torno dos quais,  governo e sociedade deverão priorizar a implantação / implementação ou o fortalecimento de determinadas atividades permanentes ou de projetos pontuais (serviços e programas), ali priorizados,  garantindo-se, desse modo, a efetividade da Política de Promoção dos Direitos Fundamentais da Criança e do Adolescente, no Ceará:



q  “Promover a priorização do desenvolvimento e da educação infantil fomentando a articulação entre as políticas públicas, programas e projetos.

q  Acompanhar e fazer cumprir a obrigatoriedade constitucional de escolarização da criança e pré-adolescente na faixa etária de 6 a 14 anos de idade.

q  Promover a construção do protagonismo juvenil, fomentando fomentando  a participação proativa principalmente de jovens-adolescentes (12 à 21 anos) na escola, na organização comunitária, no meio cultural e nos meios de comunicação; 

q  Promover a qualificação do atendimento aos adolescentes autores de ato infracional, elevando os níveis de desconcentração e de descentralização da execução pela Administração Pública de medidas sócio-educativas aplicadas, sob controle judicial e público-ministerial.

q  Defender os direitos de crianças e adolescentes em situação de violação de direitos, principalmente as vítimas de violência e exploração, postulando pela responsabilização dos seus agressores”.

A partir desse "Plano de Diretrizes Gerais", a comissão de defesa dos direitos do CEDCA-CEARÁ decidiu preferenciar a normatização mais específica do funcionamento dos programas socioeducativos, no estado, atualmente sob coordenação e execução da Secretaria de Estado da Ação Social – SAS (Coordenadoria de Proteção Social e Medidas Socio-Educativas).

Por sua vez, a comissão de promoção de direitos optou pela normatização da "rede de proteção de direitos humanos", estabelecendo normas mais específicas para o funcionamento dos conselhos tutelares, abrigos, sos-criança etc.



(..............................................................................................................................)



[1]  Isto é: texto expresso de lei vigente
[2] Ver adiante, neste texto, maior explicitação a respeito disso, quando se tratar das "atribuições" dos conselhos dos direitos da criança e do adolescente, por partes
[3] A federação é um ente nacional, formado pelos entes federados, união, estados, distrito federal e municípios, daí a possibilidade de distinção entre esfera nacional e federal, em alguns momentos, refletindo isso – cfr. CASALI JR..2000: "Tratados internacionais". Salvador.

[4] DONIZETI LIBERATI, Wilson & CYRINO, Públio Caio B.: "Conselhos e Fundos do Estatuto da Criança e do Adolescente"- São Paulo. Ed. Malheiros
[5] Poder normatizador amplo dos Conselhos dos Direitos, como se verá adiante ou do Presidente da República, Governadores e Prefeitos, por decretos (funcionamento dos Fundos para os Direitos da Infância e Adolescência, por exemplo)
[6] Os antigos Comissários de Menores, que as leis estaduais de organização judiciária deveriam extinguir ou  transformar, à luz do Estatuto (artigo 149)
[7] Dispõe o artigo 30 da CF que compete ao Município "organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local".
[8] Assim a lei federal 8.242 de 12 de outubro de 1991 denomina o CONANDA – Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
[9] Presidente da República, Governadores das Unidades Federadas e Prefeitos Municipais- aplica-se aqui por simetria o disposto no artigo 61, §1º, II da CF
[10] Conferir, adiante, neste texto, os capítulos referentes às atribuições dos conselhos dos direitos da criança e do adolescente
[11] = políticas públicas, em oposição a políticas governamentais
[12] Aqui incluídos os magistrados judiciais e os público-ministeriais
[13] Em apoio a esse entendimento: DONIZETI LIBERATI, Wilson &  CYRINO, Público Caio: op.cit.
[14] Artigo 204, II – Constituição federal
[15] Expressões mais próximas do Estatuto, considerando-se o consagrado no seu artigo 86
[16] Ver adiante neste texto o item seguinte: "Natureza político-institucional"
[17] A Federação é um ente nacional, formado pelos entes federados, União, Estados, Distrito Federal e Municípios – cfr. CASALI JR..2000: "Tratados internacionais". Salvador.
[18] AROUCA, Sérgio apud DONIZETI LIBERATI, Wilson & CYRINO, Público Caio B.: "Conselhos e Fundos no Estatuto da Criança e do Adolescente"
[19] Cfr. Atas do CONANDA. Registre-se mais, a respeito,  que o Autor secretariou esta primeira assembléia geral para constituição do CONANDA, representando a Rede dos Centros de Defesa.
[20] Constituição federal – artigos 227, §7º e 224, II.
[21] BOBBIO, Norberto.1986: "O futuro da Democracia". Rio de Janeira Ed. Paz e Terra – "Conjunto de regras primárias ou fundamentais que estabelecem quem está autorizado a tomar decisões coletivas e com quais procedimentos".
[22] COUTINHO, C. N. 1992: "Gramsci, um estudo sobre o pensamento político". Rio de Janeiro. Ed. Campus
[23] LEVY, N. 1992: "Uma Reinversão da Ética Socialista" in NOVAES, A. (org.): "Ética". São Paulo. Ed. Companhia das Letras  
[24] GRAMSCI, Antônio. 1978 : "Concepção Dialética da História". São Paulo. Ed. Civilização Brasileira.
[25] Através da  "Plenária Pro-Participação Popular na Constituinte"
[26] Loc. cit.
[27] PULANTZAS, N. apud SOUZA FILHO, R. – op. cit.
[28] NOGUEIRA NETO, Wanderlino. 1995: "Papel político dos Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente e dos Conselhos Tutelares, dentro de um modelo de democracia participativo-representativa. Uma visão gramsciana". Porto Alegre. Procuradoria Geral do Município de Porto Alegre.
[29] SOUZA FILHO, Rodrigo.1999: "Conselhos deliberativos: neo-corporativismo brasileiro?"- in "Direitos Humanos, Democracia e Senso de Justiça". Rio de Janeiro. Edição Fundação Bento Rubião. KROART Editores.
[30] Tem-se utilizado, de último, a expressão “terceiro setor”,  mais ampla e mais ligada à linha do voluntariado americano e canadense, que tem permitido incluir todo o tipo de organização corporativa social, mesmo as que tradicionalmente não se incluíam na categoria consagrada de "sociedade civil organizada" (enquanto expressões do movimento social, organizações comunitárias e assemelhadas). Nesse chamado "terceiro setor" poder-se-ia incluir partidos políticos, sindicatos, pastorais e ministérios eclesiais, fundações mantidas por empresas etc. Um "terceiro setor" em  contraste com o Estado, como “primeiro setor" (nessa concepção entendido apenas como Governo) e com o Mercado, como "segundo setor". De qualquer maneira, a expressão permanece plurívoca, pois outros autores defendem um definição oposta, fazendo do "terceiro setor" uma espécie do gênero "sociedade civil".
[31] Sociedade civil organizada
[32] Em oposição aqui ao modelo do "corporativismo estatal" e do "corporativismo neo-liberal".
[33] Como o que se teve no Brasil, nos períodos do Estado Novo (1937) e da Ditadura Militar (1964), por exemplo
[34] SOUZA FILHO, R. – loc. cit.
[35] Conferir adiante, neste texto: "Função Controladora dos Conselhos dos Direitos. (...) Procedimento de escolha dos conselheiros tutelares".
[36] Construção política,  por não se tratar de uma definição normativo-jurídica. A lei não lhes pode dar esse papel político, que extrapola a mera definição normativa, como fenômeno meta-jurídico.
[37] Mais interessa conjunturalmente à sociedade civil, esse fortalecimento dos Conselhos, pois se tratam eles de espaços e mecanismos de participação direta da população na gestão dos negócios públicos, na vida do Estado.
[38] "(SEDA, Edson. 1993: "Construir o Passado ou Como Mudar Hábitos, Usos e Costumes, tendo Instrumento o Estatuto da Criança e do Adolescente". São Paulo.  Ed. Malheiros)
[39] DE ROUSSAN, Yves T. 1994: "Entidades de defesa de direitos: articulações e integrações". Salvador. Unicef (mimeog.)
[40] Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente como "instâncias de mediação"
[41] Ver Capítulo 1 neste texto: a matéria foi tratada ali de maneira genérica
[42] Atentar para o fato de que a Constituição fala em "legislar sobre proteção da criança e do adolescente (...)" e não "legislar sobre Direito do Menor" ou "Direito da Criança" etc.
[43] Com base constitucional diversa
[44] PONTES JR., Felício classificou em 3 categorias as atribuições dos Conselhos de Direitos: "conscientizadoras, modificativas e administrativas" (in "Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente"/ SP – 1993). Reconhece pois o autor  que o Estatuto nesse ponto é meramente exemplificativo, fixando um standard mínimo. As "atribuições potencialidadoras" que aqui se fala muito se aproximam em alguns pontos das chamadas, por aquele autor, "atribuições conscientizadoras"
[45] O apoio institucional dentro do Sistema Unificado de Saúde – SUS é algo na sua própria essência, uma forma de desenvolver a Política de Saúde Pública, no país, de maneira sistemática, contínua e permanente, através órgãos próprios e competentes para tanto.
[46] Integração essa exemplificativamente enumerada no Estatuto da Criança e do Adolescente, no seu artigo 88, V
[47] Os serviços públicos chamados "SOS CRIANÇA", a serem criados por leis estaduais e municipais
[48] TORO, J. Bernardo. 1997: "Mobilização Social – um modo de construir a democracia e a participação" / Brasília.  Ed. Ministério da Justiça / SEDH.
[49] GOMES DA COSTA, Antônio Carlos. 1990: "De Menor a Cidadão" . Brasília. Ed. Fundação CBIA
[50] Inclusive tem previsão legal: ex vi, artigo 88, VI do Estatuto citado.
[51] TORO, J. Bernardo – op.cit.
[52] SOUZA  SANTOS, Boaventura de. 2000:  "A crítica da razão indolente" .  São Paulo Cortez Editora..
[53] IV Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescentes / Brasília - 2001
[54] Ver Capítulo 3, seguinte: "Papel normatizador dos Conselhos"
[55] Ver atrás, neste mesmo texto,  Capítulo 1 :  item 1.1.2. "Órgão do Poder Executivo"
[56] Ver atrás, neste mesmo texto,  Capítulo 1 ("ESSÊNCIA (...)"), especialmente os itens 1.1.2. ("Órgão especial do Poder Executivo") e 1.4.1. ("Visões da Democracia e do Estado") e 1.4.2. ( "Papéis político-institucionais de seus órgãos")
[57] Por exemplo: Escola Superior da Magistratura, Academia de Polícia, Escola Superior de Administração Fazendária etc.
[58] Mas sim, apoiando, como fazem por exemplo, UNESCO, OIT, UNESCO, USAID/Partners (Programa POMMAR), PNUD, BID, Save the Children Fund, Terre des Hommes etc. etc.
[59] Por exemplo, os Centros de Defesa da Criança e do Adolescente ou mais genéricos de defesa de direitos humanos.
[60] Conferir, neste texto, no Capítulo 1, a questão da abrangência do Estatuto, como norma geral e das suas relações com as normas especiais estaduais e municipais. E, no Capítulo 2, a análise da hipótese da legislação estadual e municipal especificamente ampliar o campo de atribuições legais dos Conselhos dos Direitos, respectivos
[61] Exercício de atividade-meio administrativo-burocrática
[62] "Controle" aqui no sentido amplo, não se confundindo com "fiscalização", como se faz algumas vezes.
[63] Artigo 86 – Estatuto cit.
[64] Conferir, atrás, neste texto, a respeito, no Capítulo 1, item 1.2.3. : "Natureza jurídica / Órgão público administrativo"
[65] Saúde, educação, saúde, assistência social, moradia, nutrição, trabalho etc. etc
[66] Artigo 86 – Estatuto cit.
[67] Saúde, Educação, Assistência Social, Habitação, Trabalho, Cultura, Previdência Social, Defesa da Cidadania,  Relações Exteriores, Segurança Pública etc.
[68] Trabalho precoce, prostituição, narcotráfico, trabalho perigoso, insalubre e penoso, trabalho escravo etc.
[69] Idem Nota 34
[70] Responsável por um gigantesco trabalho de efetivação do novo Estatuto em todo o país.
[71] Crianças, negros, mulheres, índios, minorias eróticas, portadores de necessidades especiais etc.
[72] Cúpula Mundial pela Infância. 1990: "Declaração e Plano de Ação Mundial".  Nova York. ONU
[73] O CONANDA, com propriedade, isso fez com suas Resoluções 48, 49 e 50, estabelecendo critérios mínimos para o funcionamento de unidades de internação e de semiliberdade.
[74] Conferir atrás, neste texto, o item 2.3, sobre "Articulação & Integração".
[75] Conferir adiante, neste texto, o item 4.2 , sobre "Função controladora dos Conselhos dos Direitos /. Responsabilização"
[76] O Estatuto ainda deixou a cargo dos juizes algumas funções regulamentadoras, que deveriam ter sido transferidas para o Conselho dos Direitos ou ações fiscalizadoras que deveriam ter sido atribuídas aos conselhos tutelares: freqüência de crianças e adolescentes  em bares, espetáculos públicos, casa de diversão etc. Seda vê nisso ainda retrocesso de relação à doutrina da proteção integral e conclui: "- Mas um dia ainda chegaremos lá..." (SEDA, Edson. 1995: "A Proteção Integral".  Campinas / São Paulo. Edição AIDÊS. 3ª edição)
[77] Conferir adiante neste texto o item 4.3. – "Função controladora dos Conselhos dos Direitos. Procedimento de escolha dos conselheiros tutelares"
[78] Taxinomia é o grupo de categorias descritivas que constituem um esquema ordenado para a classificação.
[79] Ou de outros estudos dessa natureza elaborados com propriedade pela Academia e/ou por ONGs especializadas.
[80] Uma vez que no plano estadual são incorporadas diretrizes nacionais e no plano municipal, diretrizes estaduais e nacionais.
[81] Conferir atrás neste texto o item 3..2.1
[82] Por exemplo, o UNICEF no momento está desenvolvendo seu planejamento a partir desse critério.
[83] Por exemplo: violência, não-acesso ao serviço público, gênero/etnia, conflito com a lei, integrações operacionais, prevenção, responsabilização, proteção jurídico-social etc.
[84] Por exemplo: mobilização, apoio institucional, empowerment (protagonismo), advocacy, parceria, pesquisas etc.
[85] Rede dos Núcleos de Estudo e Pesquisa – Associação Roda-Viva
[86] CNBB - Pastoral do Menor
[87] CNBB – Pastoral da Criança
[88] Resolução CONANDA – D.O.U. 13-10-1995.
[89] COMDAC / BELÉM. 1997: "Política Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente". Belém. Prefeitura Municipal.

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